A vida difícil dos estudantes internacionais

A vida difícil dos estudantes internacionais

Na emissão em direto do PEÇO A PALAVRA, as acentuadas desigualdades que os estudantes internacionais enfrentam são o tema deste programa.
Ismael Da Gama, do painel do PEÇO A PALAVRA, um programa da TSF Madeira 100FM e da ACADÉMICA DA MADEIRA.

O episódio do PEÇO A PALAVRA desta quarta-feira, emitido em direto às 16:00, discute um dos assuntos que tem trazido polémica ao Ensino Superior, os estudantes internacionais. Várias instituições de ensino superior encontraram nas comunidades de estudantes internacionais uma alternativa aos seus défices orçamentais, mas herdaram alguns problemas de um ingresso desregulado em localidades e instituições de acolhimento que não estavam preparadas para a vaga de estrangeiros que receberam. Outro problema, passa pela imigração ilegal, com estudantes em situações de carência económica a ingressar no Ensino Superior para obtenção de vistos de estudos e, consequentemente, a entrada na União Europeia, através da falsa intenção de estudo. A xenofobia e o racismo também são outras situações de crime de que muitos estudantes internacionais são alvo.

Nesta emissão do programa, o painel do Peço a Palavra será composto por Ismael da Gama, finalista da licenciatura de Engenharia Informática na UMa e coordenador da unidade de Política do Ensino Superior na Associação Académica, além de embaixador da Startup Portugal na Madeira. Com ele, integra o painel Francisco Afonseca, finalista da licenciatura de Engenharia Informática na UMa e membro da unidade de Política do Ensino Superior. Como convidada, Elsa Maria dos Santos Fernandes, que além de doutorada em Educação – Didáctica da Matemática, é Vice-Reitora da Universidade da Madeira, estando responsável pela área da internacionalização.

Pela legislação, de acordo com o decreto-lei n.º 36/2014, de 10 de março, que Regulamenta este estatuto, um estudante internacional é o estudante que não tem a nacionalidade portuguesa, com exceção dos nacionais de um Estado membro da União Europeia (UE) e os estudantes que, não sendo nacionais da UE, residam legalmente em Portugal há mais de dois anos.

Uma conversa sobre tecnologia e inovação

Quarta-feira, às 19:00, há emissão em direto do PEÇO A PALAVRA. Bárbara Leão Carvalho, ecologista e empreendedora social, e Miguel Muñoz Duarte, professor de empreendedorismo da NOVA SBE, são os convidados desta emissão.

Recentemente, o semanário Expresso denunciou que havia imigrantes a utilizar os cursos profissionais para se legalizarem. No verão, quando o Executivo encerrou a modalidade jurídica das manifestações de interesse (artigos 88.º e 89.º da lei n.º 23/2007, de 4 de julho), aquela que era a principal via de legalização para imigrantes, milhares de trabalhadores estrangeiros, que residiam em Portugal sem terem iniciado o processo de regularização, perderam o acesso ao mecanismo para obter uma autorização de residência. Aqueles que já estavam no país teriam de sair e entrar legalmente, mesmo que possuíssem emprego e contribuições para a Segurança Social. Assim, muitos ficaram em situação irregular. Desta forma, ganharam força os artigos 91.º e 92.º da lei que aprovou o regime jurídico de entrada, de permanência, de saída e de afastamento de estrangeiros do território nacional. O artigo 91.º trata da autorização de residência para estudantes do ensino superior e o artigo 92.º trata da autorização de residência para estudantes de outros estabelecimentos de ensino.

A alternativa encontrada por vários imigrantes passou pela apresentação do comprovativo do pagamento das propinas, um passaporte válido, um atestado de meios de subsistência e um registo criminal limpo. Enquadrado nos dois artigos referidos, o imigrante goza do direito de trabalhar e também pode ter consigo a sua família direta (filhos, cônjuge e enteados) por meio da modalidade de reagrupamento familiar.

No Reino Unido, o governo trabalhista, empossado no verão, prometeu manter a interdição de os estudantes internacionais terem dependentes a viver no país, estando previstas, em territórios como os Países Baixos, maiores restrições de ingresso dos estudantes internacionais. Há outros países, como o Canadá e a Austrália, que anunciaram restrições no acesso de estudantes internacionais, fazendo os pedidos de visto caírem até 30% dos valores de 2023. Em todo o mundo, segundo dados da Holon IQ, o mercado de educação internacional representa cerca de 182 mil milhões de euros.

Qvo vadis?

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Segundo a advogada Érica Acosta, entrevistada pelo Expresso, pessoas emigradas em Portugal, face à alteração legislativa, “ficaram, e continuam, completamente desesperadas, vulneráveis, apanhadas num limbo jurídico de que estão a tentar sair pelos meios legais possíveis”.

Os dados da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), que substituiu o antigo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, indicavam que as concessões de autorizações de residência para estudantes, em 2024, foram inferiores ao registado nos primeiros oito meses de 2023. Em 2024, para os estudantes do ensino superior foram dadas 972 autorizações e para estudantes do ensino secundário, 4336 autorizações. A ausência de crescimento entre 2023 e 2024 pode ser explicada pela morosidade no agendamento dos pedidos junto da AIMA, fazendo com que os requerentes comecem a estudar sem regularizarem a sua situação junto da Agência, não aumentando as estatísticas.

Entre os casos populares do país, o Instituto Politécnico de Bragança (IPB) configura-se como uma das instituições com mais estudantes internacionais. Se em 2018, dos sete mil estudantes, dois mil eram estrangeiros, em 2023, perto de 3600 são estudantes internacionais, de um total de 10 mil, oriundos de 60 países dos cinco continentes. Há um ano, quando a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Elvira Fortunato, visitou o IPB, os estudantes apontavam que um dos problemas era o facto de “as propinas dos estudantes internacionais serem o dobro das dos nacionais”. Além disso, o problema do alojamento também atingia esse segmento de estudantes.

O associativismo e a juventude

Hoje, às 16:00, há emissão em direto do PEÇO A PALAVRA. O médico João Pedro Vieira, antigo dirigente associativo, fala sobre a participação cívica.

Enquanto os estudantes do IPB destacavam a boa integração com os colegas e a cidade, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em maio de 2023, um caso de xenofobia, voltou a marcar a instituição que, no passado, se viu confrontada com casos similares. Em 2019, uma caixa de pedras foi colocada na faculdade para serem atiradas aos estudantes brasileiros que passaram “à frente [dos portugueses] no mestrado”. Além dos custos com as propinas, a alimentação, os materiais e o alojamento, a integração é um problema para os estudantes internacionais.

Dados divulgados pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas em 2022, relativos ao ano letivo de 2021-2022, indicam que Portugal teve 69.965 estudantes internacionais inscritos, mais 18,7% do que o registado no ano transacto (58.960). No país, a maior comunidade de estudantes internacionais é proveniente dos países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP). Se, em 2016-2017, eram 7333 estudantes, alguns anos depois, em 2021-2022, registavam-se 19.930 estudantes, com destaque para a Guiné-Bissau. Para compararmos com o maior mercado mundial dos estudantes internacionais, o Reino Unido, no ano letivo 2021-2022, os britânicos registraram um número recorde de 679.970 estudantes internacionais.

Em 2017, os primeiros grupos de estudantes da província do Free State, na África do Sul, chegaram à Universidade da Madeira e a instituição começou a operacionalizar uma nova estrutura para receção e acompanhamento dos estudantes internacionais. Desde então, o número de estudantes internacionais foi variando, assistindo a um máximo no ano letivo 2023-2024, com 149 estudantes, com destaque para os estudantes oriundos de São Tomé e Príncipe (16) e da Guiné (10).

Enquanto a Universidade da Madeira não atinge as prometidas 434 camas nas residências estudantis, o governo regional prorrogou a afectação do Centro de Juventude de Santana para residência universitária, continuando a receber vários alunos da instituição madeirense. Fruto de um protocolo com o Ministério do Turismo e Cultura de São Tomé e Príncipe, no ano letivo de 2021-2022, 40 alunos são-tomenses constituem a maioria dos residentes.

Um dos problemas que ainda não mereceu muita atenção mediática, mas que está no centro das preocupações dos estudantes, é o sucesso académico. Enquanto, na generalidade, as desistências e os abandonos escolares são fenómenos cada vez mais estudados, faltam dados e estudos, com a mesma frequência, sobre este segmento particular. Informalmente, na Universidade da Madeira, vários docentes relatam que há estudantes internacionais que, por força de situações de grande carência económica nos países de origem, são obrigados a dedicarem-se ao trabalho, não tendo apoio dos seus Estados de origem para o alojamento e a alimentação, e, em várias situações, sendo elementos fundamentais no sustento das suas famílias, fazendo remessas de dinheiro para o estrangeiro.

A vida do estudante internacional, deslocado do seu país de origem e, em muitos casos, longe dos seus familiares dadas as políticas de imigração mais restritivas, compõe-se com fortes desafios para atingir o esperado sucesso académico com a conclusão dos seus cursos. Enquanto muitas universidades ainda estão a desenvolver as estruturas de apoio essenciais para o acompanhamento desses estudantes, há uma grande disparidade entre as propinas por eles devidas. O alojamento, em qualquer ponto do país, é um problema estudantil, especialmente agravado para os estrangeiros, que não têm alternativa de alojamento familiar, como alguns portugueses.

O Peço a Palavra discute o universo em expansão dos estudantes internacionais, enquanto espaço em que o Ensino Superior, a Ciência e a Tecnologia estão em debate, porque os estudantes pediram a palavra. O seu nome tem origem na intervenção que tornou célebre o jovem líder estudantil em Coimbra Alberto Martins e espoletou a Crise Académica de 69. Trata-se de uma produção da TSF Madeira 100FM com a Académica da Madeira, transmitida em direto, quinzenalmente às quartas-feiras e disponível em podcast, nas principais plataformas do mercado.

Luís Eduardo Nicolau
com Carlos Diogo Pereira
ET AL.
Com fotografia de Henrique Santos.

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