O futuro da leitura em Portugal: sustentabilidade, inclusão e desafios digitais

O futuro da leitura em Portugal: sustentabilidade, inclusão e desafios digitais

O relatório do Book 2.0 explora o impacto dos livros em Portugal, abordando sustentabilidade, hábitos de leitura e os desafios da digitalização no setor editorial.
Book 2.0, em setembro de 2024, no Museu do Oriente.

Em setembro, a Associação que gere a indústria dos editores de livros em Portugal organizou a segunda edição da sua “jornada conjunta pelo futuro do livro”, o Book 2.0. Uma das ações do evento foi a promoção de um relatório sobre a leitura e o mercado editorial.

O relatório destaca a importância dos livros como agentes transformadores na sociedade, capazes de nos conectar ao mundo e a nós mesmos. Define os livros como “uma ponte entre o conhecimento e a ação, entre o presente e as nossas origens”, sublinhando o seu poder transformador num país como Portugal, onde ainda existem desafios significativos em termos de literacia. A Diretora Executiva do Book 2.0, Silvia Rodriguez, reforça esta ideia ao afirmar que os livros “despertam a paixão pela leitura, impulsionando mudanças positivas na sociedade e participando de forma ativa, que ajudarão a mudar o rumo da nossa história”.

O relatório traz também uma reflexão inovadora sobre a sustentabilidade na indústria editorial portuguesa, apresentando um estudo sobre a pegada ecológica do setor. Em 2023, a produção de livros em Portugal gerou cerca de 9.874 toneladas de dióxido de carbono, representando 0,017% das emissões totais do país. A maior parte das emissões decorre da produção de papel (41%) e da impressão (28%), enquanto os restantes 20% provêm de materiais como tintas e colas. Estes dados ilustram a necessidade de transformar o setor em direção a práticas mais sustentáveis, já que cada livro físico gera em média 550 gramas de dióxido de carbono, o equivalente a conduzir cinco quilómetros num carro novo ou a consumir 15 horas de streaming. Rachel Martin, Diretora Global de Sustentabilidade da Elsevier, alerta que “as alterações climáticas afetam agora todos os continentes na Terra. Já não são uma preocupação longínqua. São a nossa realidade imediata”. O relatório recomenda que autores, editores e leitores se envolvam ativamente no processo de redução do impacto ambiental e que os consumidores sejam mais conscientes sobre a origem dos livros que adquirem.

Jovens e mulheres são os que mais leem

A leitura de livros na UE revela padrões demográficos que refletem mudanças nas preferências culturais e nos hábitos de consumo, destacando-se os jovens e as mulheres como os principais leitores em quase todos os países membros.

Além da questão ambiental, o relatório analisa os hábitos de leitura e compra de livros em Portugal, que têm mostrado sinais de recuperação. Em 2023, o número de portugueses que compraram livros aumentou de 62% para 65%, com um crescimento expressivo entre os jovens de 15 a 24 anos. Contudo, a média de leitura no país permanece baixa, com apenas 5,6 livros lidos por ano, colocando Portugal abaixo da média europeia. Apesar disso, o formato físico continua a ser o preferido por 93% dos leitores, embora os e-books estejam a ganhar terreno como uma alternativa viável para expandir o acesso à leitura. O romance lidera as preferências literárias, com 61% dos leitores a optar por este género, o que reflete um padrão de consumo que favorece a imersão em narrativas profundas e emocionais. Pedro Sobral, Presidente da Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, reforça a necessidade de tornar os livros mais acessíveis, afirmando que “o acesso ao livro deve ultrapassar as desigualdades económicas”.

No entanto, a digitalização do setor apresenta desafios significativos, sobretudo no que diz respeito à pirataria digital. O relatório revela que a maioria dos leitores digitais acede a conteúdos ilegais, o que compromete os direitos autorais e a sustentabilidade económica da indústria. Este fenómeno levanta questões prementes sobre o futuro do livro digital e sobre a forma como o setor pode enfrentar esta ameaça. Pedro Sobral questiona: “Se todos os conteúdos são grátis e estão disponíveis livremente, quantos escritores e escritoras restarão para mudar o mundo?” Este alerta destaca a importância de um equilíbrio entre a democratização do acesso e a proteção dos criadores.

A análise apresentada no relatório reafirma o papel central dos livros na promoção da literacia, na inclusão social e na construção de uma sociedade mais informada e crítica. O futuro do setor depende de um esforço conjunto entre todos os intervenientes, desde autores a leitores, passando por editores e políticas públicas que favoreçam o acesso universal ao livro e promovam práticas mais justas e sustentáveis.

Carlos Diogo Pereira
Com Luís Eduardo Nicolau.
ET AL.
Com fotografia da APEL.

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