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Esta semana de avaliações afeta o seu bem-estar?

Esta semana de avaliações afeta o seu bem-estar?

O PEÇO A PALAVRA discute o bem-estar dos jovens universitários, explorando os desafios da saúde mental, financeira e social que afetam o equilíbrio entre a vida académica, pessoal e profissional.
PEÇO A PALAVRA de 18 de dezembro de 2024, com Maria Velosa, licenciada em Ciências da Nutrição pela Faculdade de Medicina de Lisboa e antiga Presidente da Direção da ANEN (Associação Nacional de Estudantes de Nutrição) e Mafalda Brazão, estudante de Medicina na Universidade da Madeira e responsável pela Secção de Promoção da Saúde na ACADÉMICA DA MADEIRA.

O PEÇO A PALAVRA de hoje trata de um tema que não pode ser ambíguo, apesar da sua vastidão e complexidade, o bem-estar dos jovens universitários. Para um jovem, o bem-estar pode ser considerado o equilíbrio entre a saúde física, a mental e a emocional, as relações sociais positivas, a satisfação académica ou profissional, e o tempo para lazer e desenvolvimento pessoal.

No painel desta emissão, Gonçalo Nuno Martins, investigador e doutorando em Química na Universidade da Madeira, além de revisor de texto na Imprensa Académica e na Cadmus, e Mafalda Brazão, estudante de Medicina na Universidade da Madeira e responsável pela Secção de Promoção da Saúde na Académica da Madeira. Como convidada teremos Maria Velosa, natural da Madeira, licenciada em Ciências da Nutrição pela Faculdade de Medicina de Lisboa e antiga Presidente da Direção da ANEN, a Associação Nacional de Estudantes de Nutrição. Também convidado do programa, Rui Almeida, natural de Famalicão, é médico especialista de Medicina Geral e Familiar, pós-graduado em Diabetologia e Medicina Desportiva e nove vezes campeão nacional de andebol.

Os desafios do equilíbrio da complexa equação que pode ditar o bem-estar do jovem estudante universitário incluem a pressão académica ou profissional, a falta de apoio à saúde física e mental, as dificuldades financeiras, o uso excessivo de tecnologia, as relações sociais instáveis e a dificuldade em gerir o tempo entre as responsabilidades e o lazer.

Os aspetos da vida do jovem universitário relacionados com a pressão académica ou profissional incluem o desempenho académico, uma vez que a necessidade de obter boas notas e evitar reprovações gera ansiedade, como demonstrado por estudos da Associação Nacional de Estudantes de Psicologia (ANEP) e relatórios da OCDE. Muitos jovens sentem que o sucesso académico define o seu valor pessoal e futuro profissional. A gestão do tempo é outro desafio, pois conciliar as aulas com os trabalhos, o estudo, os estágios e a vida pessoal pode ser complexo. A falta de organização leva ao stress e à sensação de sobrecarga. Também as expetativas familiares e sociais sobre o sucesso académico ou profissiona e a incerteza sobre o futuro profissional, agravada pelo medo do desemprego ou da precariedade laboral, após a conclusão dos estudos, afetam o bem-estar, por serem fonte comum de stress. E estes aspetos são ainda agravados pela competitividade do mercado de trabalho. Outro fator que gera ansiedade nos estudantes é o equilíbrio entre a vida pessoal, o trabalho e o estudo. Cada vez mais universitários trabalham enquanto fazer o curso para suportar as despesas da sua formação. As horas laborais, somadas ao tempo letivo ou de trabalho académico, reduzem o tempo disponível para descanso, lazer e vida social. Por fim, a comparação social no ambiente universitário intensifica o confronto de desempenho entre os colegas, aumentando a autocrítica e diminuindo a autoestima. Esses fatores interligam-se e contribuem para um ambiente de elevada exigência, onde o desempenho académico toma uma importância desproporcionada em relação ao bem-estar mental e físico do estudante.

Este mês, a ANEP, em colaboração com a Ordem dos Psicólogos Portugueses, divulgou uma investigação sobre a saúde mental dos estudantes do ensino superior em Portugal. Entre 1174 estudantes inquiridos, de 53 instituições do ensino superior, um em cada quatro estudantes recorre a medicação psiquiátrica. Dos problemas sofridos e identificados pelos inquiridos, 46% apresentam sintomatologia depressiva significativa, 39% sofrem de ansiedade e 31% manifestam stress. O estudo destaca que os estudantes com menor acesso a serviços de saúde mental nas universidades apresentaram níveis mais elevados de sintomas psicológicos, sublinhando também a importância dos serviços de apoio psicológico na promoção do bem-estar e do desempenho académico.

Outros sinal de alerta para o problema em Portugal é o consumo de antidepressivos. Este tem registado um aumento significativo, tenho o nosso país dos índices mais altos da OCDE. Em 2021, 14 doses diárias por 100 habitantes eram consumidas, colocando Portugal em segundo lugar, em toda a OCDE, apenas atrás da Islândia. Entre 2000 e 2020, o consumo aumentou 304% em Portugal.

O consumo de fármacos psiquiátricos entre jovens, como os antidepressivos e os ansiolíticos, pode ter diversas consequências, incluindo o risco de dependência e tolerância, efeitos secundários como a fadiga, as insónias e as dificuldades de concentração, além de uma abordagem apenas sintomática que não trata as causas subjacentes dos problemas de saúde mental. Este uso pode também interferir no desenvolvimento emocional, limitando a capacidade dos jovens para aprenderem estratégias saudáveis de adaptação ao stress, e pode comprometer o desempenho académico e profissional, agravando sentimentos de frustração. Acresce ainda o impacto do estigma social associado à medicação, que pode levar ao isolamento ou à dificuldade em procurar ajuda, reforçando a necessidade de um acompanhamento adequado e de medidas preventivas eficazes.

O bem-estar também passa pela prática de atividade física regular entre jovens universitários. Um estudo realizado em 2017, que avaliou estudantes de duas universidades portuguesas, revelou que 35% dos inquiridos apresentavam um nível de atividade física baixo. As principais barreiras identificadas para a não participação em programas de atividade física incluíam a disponibilidade de tempo, os horários incompatíveis, a distância e os custos associados. Os estudantes que praticavam atividade física regularmente apontaram como principais motivações a melhoria da condição física, o alívio do stress, a diversão, a prevenção de doenças e aumento da autoestima. Este cenário reflete uma tendência nacional mais ampla, onde 45% dos adultos não cumprem as recomendações mínimas de atividade física da Organização Mundial da Saúde (OMS), colocando Portugal entre os países da União Europeia com menores índices de prática desportiva. Em contraste, a Finlândia apresenta apenas 20% da população adulta a não atingir as metas recomendadas pela OMS, evidenciando uma cultura mais enraizada de atividade física.

Partindo da saúde e chegando ao bolso, os jovens portugueses enfrentam dificuldades financeiras significativas que afetam várias áreas das suas vidas. A estabilidade orçamental é uma das suas maiores preocupações, com estudos a indicar que 94% dos jovens portugueses expressam receios nesta área. Cerca de metade admite ter dificuldades em cobrir as suas despesas diárias, evidenciando a pressão económica que enfrentam. A literacia financeira é outro desafio: o relatório PISA 2022 aponta uma diminuição significativa no conhecimento financeiro dos jovens portugueses desde 2018, colocando Portugal abaixo da média da OCDE. Apenas 38% dos jovens possuem conta bancária, muito abaixo da média europeia de 63%, e a utilização de cartões de crédito ou débito também é limitada, com apenas 27% a reportarem este hábito. Além disso, a taxa de risco de pobreza em Portugal foi de 17% em 2022, afetando todas as faixas etárias, incluindo os jovens. Aliado à precariedade laboral e à dificuldade de acesso à habitação própria, agrava ainda mais a situação financeira desta geração. Estas dificuldades impactam a capacidade dos jovens de alcançar independência económica e estabilidade, influenciando negativamente o seu bem-estar e perspetivas futuras.

Os jovens portugueses enfrentam desafios significativos no acesso à habitação, tanto na compra como no arrendamento. Os elevados preços das casas tornam a aquisição de uma residência própria uma meta distante para muitos. No setor do arrendamento, a escassez de oferta e os preços elevados agravam a situação, levando muitos jovens a permanecerem na casa dos pais por períodos prolongados. Dados de 2023, da OCDE, indicam que mais de 70% dos jovens entre os 18 e 34 anos em Portugal ainda residem com os progenitores, uma das percentagens mais altas da União Europeia. Esta realidade reflete a necessidade urgente de políticas públicas eficazes que promovam o acesso dos jovens a habitação acessível e adequada.

Em Portugal, diversos estudos têm analisado o impacto do uso excessivo da tecnologia no bem-estar dos jovens. Uma investigação divulgada pelo Portal da Saúde revelou que 73,3% dos jovens, entre os 14 e os 25 anos, apresentavam sintomas de dependência da internet, com 13% a manifestarem níveis severos dessa dependência. Outro estudo, citado pela SIC Notícias, indicou que mais de metade dos jovens utiliza dispositivos digitais até à hora de adormecer, o que afeta negativamente a qualidade do sono. Além disso, a utilização média diária de tecnologias digitais entre crianças e adolescentes foi estimada em sete horas, sendo cinco dedicadas a atividades escolares, segundo dados apresentados pela SAPO TEK. A OMS tem alertado para o aumento do uso problemático das redes sociais entre os jovens europeus. Em 2022, 11% dos adolescentes apresentaram sinais de utilização problemática das redes sociais, um aumento em relação aos 7% registados quatro anos antes. Este comportamento é mais evidente entre adolescentes romenos (28%) e menos comum nos Países Baixos (3%). Os dados do estudo da OMS indicam que 86% dos jovens portugueses admitem estar viciados nas redes sociais, em comparação com a média europeia de 78%. Nesta senda, 80% dos jovens lusos preferem comunicar através das redes sociais em vez de pessoalmente.

O problema continua com as relações sociais instáveis. De acordo com o Inquérito Social Europeu de 2022, 45% dos jovens portugueses, entre os 18 e os 29 anos, reportam sentir-se sozinhos com frequência ou ocasionalmente, refletindo dificuldades no desenvolvimento de relações sociais estáveis e satisfatórias. Um estudo do Eurofound, em 2021, revelou que 32% dos jovens portugueses sentiram que a pandemia de COVID-19 piorou significativamente a qualidade das suas relações sociais, acentuando sentimentos de isolamento e desconexão. Estes dados mostram que, embora os jovens valorizem o contacto com amigos e familiares, fatores como a instabilidade económica, a falta de independência e os efeitos da pandemia têm contribuído para o aumento da solidão e da fragilidade das suas relações sociais em Portugal.

Os jovens portugueses também enfrentam desafios significativos na gestão do tempo entre as responsabilidades académicas, profissionais e os momentos de lazer. A crescente pressão para alcançar sucesso académico e profissional, aliada à precariedade laboral e à necessidade de conciliar múltiplas atividades, contribui para níveis elevados de stress e ansiedade. Um estudo da Deloitte revela que 49% da Geração Z (18-26 anos) e 43% dos Millennials (27-42 anos) em Portugal relatam sentir-se stressados durante grande parte ou todo o tempo, indicando dificuldades em equilibrar as diversas exigências do quotidiano.

A busca por um equilíbrio entre vida pessoal e profissional tem levado muitos jovens a valorizar modelos de trabalho mais flexíveis. O mesmo estudo aponta que 68% da Geração Z e 75% dos Millennials considerariam procurar um novo emprego caso o seu empregador exigisse presença física diária, demonstrando a importância atribuída à flexibilidade laboral para melhor gerir o tempo e reduzir o stress.

A dificuldade em desligar-se das responsabilidades profissionais fora do horário de trabalho também é evidente. Cerca de 23% da Geração Z e 25% dos Millennials portugueses afirmam responder a e-mails e mensagens profissionais diariamente após o expediente, o que pode comprometer o tempo destinado ao lazer e ao descanso, essenciais para o bem-estar. Estes dados refletem a necessidade de políticas e práticas que promovam um equilíbrio saudável entre as diversas esferas da vida dos jovens, permitindo-lhes gerir eficazmente o tempo entre responsabilidades e momentos de lazer.

O PEÇO A PALAVRA discute o bem-estar dos jovens porque os estudantes pediram a palavra. O nome do programa tem origem na intervenção que tornou célebre o jovem líder estudantil em Coimbra Alberto Martins e espoletou a Crise Académica de 69. Trata-se de uma produção da TSF Madeira 100FM com a Académica da Madeira, transmitida em direto, quinzenalmente às quartas-feiras e disponível em podcast, nas principais plataformas do mercado.

Luís Eduardo Nicolau
com Carlos Diogo Pereira
ET AL.
Com fotografia de Henrique Santos.

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