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Biodiversidade noturna ameaçada pela Poluição Luminosa

“A poluição luminosa é um problema global e que afeta não só a biodiversidade com hábitos noturnos, incluindo o ser humano, como também a atividade astronómica. As zonas urbanas sofrem mais com este problema, de tal modo que do centro das nossas cidades é quase impossível observar estrelas”, afirma Cátia Gouveia, coordenadora da SPEA Madeira e do projeto LIFE Natura@night.

Para além do Homem e outros mamíferos, a poluição luminosa afeta outros grupos de seres vivos, em especial com hábitos noturnos: aves, répteis, anfíbios, plantas, insetos e morcegos. Por esta razão, a SPEA relembra a importância da adoção de iluminação pública adequada, levando em consideração a eficiência energética, mas também o impacto na biodiversidade.

Os insetos noturnos desempenham várias funções importantes nos ecossistemas. Estes são a base da cadeia alimentar de muitas espécies, contribuem para a reciclagem de matéria orgânica como decompositores, atuam como controladores de pragas e são essenciais como polinizadores. O declínio dos insetos polinizadores pode ter consequências graves também para a saúde humana, levando à diminuição da diversidade alimentar e deficiências nutricionais.

Estes insetos são atraídos pela luz, pois o brilho da lua e das estrelas é usado como um “farol de navegação”; que os orienta na noite de forma a retornarem ao seu habitat, encontrarem alimento ou parceiro e fugir de predadores. No entanto, as luzes artificiais confundem esses insetos, levando-os a segui-las, o que resulta em morte por ficarem visíveis a predadores, colisão ou exaustão. Têm-se verificado um declínio significativo na população de insetos noturnos devido a esta perturbação.

As aves marinhas possuem um esforço reprodutivo elevado, com a deposição de apenas um único ovo por ano. Além disso, essas aves tendem a afastar-se de zonas iluminadas e passam grande parte da vida no mar, regressando às colónias à noite. Estas aves possuem olhos adaptados à visão noturna e orientam-se pelas estrelas durante suas movimentações, mas possuem uma grande sensibilidade à luz. Muitas vezes, os juvenis dessas aves são desorientados e enganados pelas luzes artificiais, resultando na perda do rumo. Estas aves podem cair ao chão, sofrer ferimentos e até mesmo morrer devido à exaustão resultado do encadeamento que sofrem. Mesmo feixes de luz de baixa potência perturbam as rotas de voo das aves marinhas.

Os morcegos são considerados um dos poucos mamíferos terrestres presentes na Macaronésia. Nessa região, existem 16 espécies de morcegos, sendo a maioria insetívora, com exceção do morcego-da-fruta-egípcio, que foi introduzido em Gran Canaria. Uma espécie endémica da Macaronésia é o morcego-da-Madeira, classificado como Criticamente em Perigo no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal.

A capela do Corpo Santo do Funchal

A confraria do Corpo Santo apoiava os seus confrades na doença e em acidentes, como naufrágios e ataques de corsários, tal como depois nos enterros dos seus membros, às viúvas e aos filhos dos mesmos. Corpo Santo é a denominação popular de S. Pedro Gonçalves Telmo (1190-1246), religioso da ordem

Uma característica marcante dos morcegos é a sua posição de dormir de cabeça para baixo, esta serve como estratégia de prevenção contra predadores, além de ser uma adaptação ao seu peso corporal elevado. Eles possuem adaptações morfológicas que evitam o estagnamento do sangue na cabeça e um tendão no dedo do pé que impede a queda quando estão suspensos. Na Madeira, os morcegos entram em torpor durante o inverno, reduzindo o metabolismo, a temperatura corporal e, consequentemente, o gasto energético.

A poluição luminosa pode impactar a disponibilidade dos recursos alimentares dos morcegos, pois as presas migram para áreas iluminadas. Mesmo os morcegos mais tolerantes à luz, que conseguem beneficiar do aumento de presas em áreas urbanizadas, são prejudicados pois ficam expostos a predadores. A poluição luminosa pode ainda afetar nos locais de abrigo de morcegos, alterando padrões de saída e reduzindo o tempo de alimentação destes animais.

Os seres humanos também são afetados pela poluição luminosa, pois esta altera o ciclo do sono, a produção de hormonas, os batimentos cardíacos e o humor. Ainda, a insuficiência de sono causa um aumento na probabilidade de desenvolvimento de cancro. Por outro lado, a iluminação excessiva leva a maiores gastos energéticos e financeiros afetando todos os cidadãos.

A poluição luminosa é um problema complexo, sendo que os seus efeitos negativos vão desde a desregulação do ciclo biológico, perturbações na sua orientação e migração, riscos de colisão e exaustão, e impactos na disponibilidade de alimentos e abrigo.

A preservação dos céus noturnos, a proteção da vida selvagem e a promoção da saúde humana são metas que devem ser procuradas alcançar em conjunto. Desta forma, o projeto LIFE Natura@night conta com 13 parceiros e tem como objetivo reduzir a poluição luminosa nas áreas protegidas dos arquipélagos da Macaronésia. Ao trabalhar com autoridades locais, pescadores e comunidade para reduzir a poluição luminosa, estaremos também a implementar iluminação mais eficiente, contribuindo para uma melhor gestão de recursos e combatendo as alterações climáticas. Mais informação em www.naturaatnight.spea.pt.

Elisa Teixeira
Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves
Com fotografia de Usukhbayar Gankhuyag, de um céu estrelado em Batsumber, Mongólia.

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