Vice-Reitora afirma que a UMa não tem conseguido obter dados com os estudantes sobre desistência e abandono

Vice-Reitora afirma que a UMa não tem conseguido obter dados com os estudantes sobre desistência e abandono

A Vice-Reitora foi entrevistada pela ET AL. no início do ano letivo para falar sobre o Programa de Promoção de Sucesso e Redução do Abandono, financiado pelo governo em milhões de euros e que começou a ser aplicado na Universidade da Madeira. Com a dotação orçamental reclamada, como serão os resultados da UMa?

A UMa, durante anos, tem reclamado por mais verbas para melhorar o seu desempenho. Na área da promoção do sucesso e da redução do abandono e da desistência, as instituições das regiões de Lisboa, do Algarve, dos Açores e da Madeira, com base em dotações do Orçamento do Estado, receberão um montante global de 3,7 milhões de euros.

Em maio, o reitor da Universidade da Madeira foi confrontado com dados preocupantes sobre o desempenho: “em 2013-2014, a UMa tinha mais de 600 estudantes nos seus vários cursos de mestrado. Os dados de 2021-2022 revelavam que baixamos para cerca de 400 estudantes no 2.º ciclo. No mesmo período, em doutoramento, a UMa tinha, há dez anos, quase 100 estudantes e, em 2021-2022, registava um número inferior”. Em resposta ao Presidente da Direção da ACADÉMICA DA MADEIRA acabou por fundamentar o problema da instituição com um cenário errado no “interior e sul” do país.

Em 2023, a ACADÉMICA DA MADEIRA referia a falta de dados e de transparência também sobre o abandono e a desistência, “sendo que a UMa não é exceção no tratamento e no combate deficitário desses flagelos, apesar de saber-se que só no primeiro trimestre de 2023, cerca de 340 estudantes (quase 10% da comunidade estudantil) abandonaram os seus estudos nesta instituição”.

O Programa de Promoção de Sucesso e Redução de Abandono no Ensino Superior foi criado pelo governo para financiar as instituições, no quadro do combate ao abandono e à desistência, tentando aumentar o sucesso dos estudantes.

Segundo o ministério, “em fevereiro, 6,6 milhões de euros beneficiaram projetos em 24 instituições de ensino superior públicas e privadas. No conjunto das duas fases, já foram disponibilizados mais de 10 milhões de euros para reduzir o abandono no Ensino Superior”. Os dados indicam que o abandono no ensino superior em Portugal, de 12%, está abaixo da média da OCDE, situada em 21%. No primeiro ano, a média é de 12% na OCDE e 8% em Portugal.

Custódia Drumond, Vice-Reitora para a Área Académica e entrevistada abaixo, é uma das responsáveis pela implementação do programa governamental na UMa, através de uma candidatura aprovada em 2023.

O que é que a Universidade da Madeira entende como abandono e como desistência?

Desistência é quando o estudante formaliza o ato, solicitando aos assuntos académicos a anulação da inscrição no ano letivo que se encontra a decorrer.

O abandono apenas se consegue apurar depois de encerradas as renovações num dado ano, e só após o período de renovação com multas. É considerado abandono quando o estudante não terminou o curso, nem prescreveu e não renovou a sua inscrição.

Como é que interpreta os dois fenómenos?

Em princípio, a decisão de um estudante anular a inscrição de forma formal, resulta do conhecimento de que essa é a forma correta de proceder e da vivência de uma situação que lhe traz mal-estar: dificuldade financeira, problemas de saúde consigo ou com familiares, desagrado do curso que frequenta, vontade de mudar de curso, dificuldades em conciliar o emprego com os estudos em casos de estudantes trabalhadores, entre outros possíveis motivos.

Acredito que em diversos casos a Universidade poderia ajudar a minimizar as dificuldades, através dos seus serviços, ou canais de ajuda e esses estudantes poderiam continuar o seu percurso sem abandonar a frequência do ensino superior.

Acredito que algumas das situações de abandono assentam em desconhecimento por parte dos estudantes de que se efetuarem o requerimento para anulação de inscrição podem evitar o pagamento integral da propina. Também podem resultar de decisões tomadas em consequências de situações como as atrás referidas depois do início do 2.º semestre e, nesse caso, os estudantes teriam de pagar a propina integral, mesmo com o pedido formal de anulação no InfoAlunos.

Tem valores diferentes para os dois fenómenos?

Sim, os valores são distintos. Contudo, nesta altura, estando as inscrições ainda a decorrer, não é possível apurar o valor dos abandonos. O valor dos abandonos é superior ao das desistências, pois o primeiro pode incluir o segundo, caso quem desista decida não renovar a inscrição no ano seguinte. Note-se que há alguns casos de estudantes que desistem, mas que no ano seguinte decidem renovar a sua inscrição.

Podemos dizer que as principais causas para o abandono na nossa Universidade são estas fundamentadas com os dados?

As principais causas são as dificuldades financeiras, mas não necessariamente associadas à propina, as dificuldades na adaptação ao ensino superior que por vezes provoca ansiedade e dificuldade na gestão do dia a dia do estudante, problemas de saúde no seio familiar e também dificuldade na conciliação de compromissos assumidos, como sejam os laborais e familiares e os estudos.

Portanto as razões não são conhecidas.

Conhece-se a maioria das razões, mas o problema é não conseguir atuar a tempo, por desconhecimento das situações quando as mesmas ocorrem, uma vez que o estudante decide desistir ou abandonar os estudos sem procurar ajuda.

Os números são sempre fornecidos pelo aluno, não é a instituição que recolhe essas razões?

Sim, é verdade. Com a proteção de dados a instituição apenas pode contactar o estudante pelo endereço institucional que muitas vezes não é acedido pelos estudantes. Na grande maioria das vezes continuam a utilizar o seu endereço pessoal e consultam pouco ou mesmo nunca o email institucional, apesar das recomendações feitas para a importância do uso do endereço institucional.

Ou seja, quando o aluno não se inscreve no ano seguinte, só se o aluno justificar à instituição é que ela sabe?

Quando o estudante dá autorização para usar os seus dados, pode ser feito um telefonema, mas um estudante que desistiu ou abandonou pode não querer voltar a interagir com a instituição. Por outro lado, a instituição não tem seguido essa metodologia e, pode, de facto, conciliá-la com outras estratégias. De há 2 anos para cá, no ato da matrícula, a UMa tem inquirido os estudantes quanto à autorização para utilizar dados pessoais, nomeadamente o endereço eletrónico para o envio de informação complementar ao curso que frequenta.

Mas não podem telefonar, por exemplo, fazer esse rastreio?

Não se conseguiu introduzir alterações nos procedimentos, pois os recursos humanos existentes estão com demasiadas tarefas entre mãos. E é devido a isso que agora com o Observatório do Estudante [da UMa] queremos implementar medidas para conseguirmos monitorizar o percurso dos estudantes, sobretudo os do primeiro ano, que é onde incide essencialmente o abandono. É por isso que nós queremos aproveitar o projeto para criar uma plataforma com o registo de dados e o Observatório vai interagir com os diretores de curso para que, com dados, mas também no terreno, se melhore a ajuda aos estudantes.

E desses dois anos para cá têm conseguido obter dados com esses alunos que desistiram ou abandonaram?

Ao nível dos dados, aquilo que percecionamos é que nos dois últimos anos e também devido à pandemia os números têm sido maus no sentido de que a percentagem de alunos que se têm inscrito, que têm renovado a matrícula do primeiro para o segundo ano tem baixado e também o número médio de ECTS dos alunos do primeiro ano tem diminuído.

Queremos inverter estas situações, e é com este projeto que nós queremos ver se relativamente ao ano anterior, a percentagem de alunos que renovam a inscrição no segundo ano aumenta e se a média dos ECTS nos alunos do primeiro ano também aumenta. São estes os 2 indicadores fundamentais do projeto.

A entrevista teve lugar no Colégio dos Jesuítas do Funchal, a 4 de outubro de 2023. Por opção da Universidade da Madeira, o conteúdo da entrevista, gravada com autorização e posteriormente transcrita, foi alterada, em diversas partes, não correspondendo ao que foi originalmente captado. A Universidade da Madeira fez alterações profundas ao que a Vice-Reitora afirmou. Note-se, por exemplo, a pergunta “Como é que interpreta os dois fenómenos?”, cuja resposta original de Custódia Drumond foi apenas “aquilo que nós temos de fazer é apurar os valores”, completamente diferente do que foi remetido para publicação, como pode ser lido acima. Quando questionada se tinha “valores diferentes para os dois fenómenos”, a dirigente académica respondeu “não sei, nesta altura não se consegue ver quais são os abandonos relativamente ao ano anterior”. Acima, podemos ler a resposta posterior da UMa: “Sim, os valores são distintos”.

Entrevista conduzida por Luís Eduardo Nicolau
e Carlos Diogo Pereira
ET AL.
Com fotografia de Viktor Forgacs.