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Alex Faria aponta “desigualdades graves no financiamento” das Universidades

Alex Faria, Presidente da Direção da ACADÉMICA DA MADEIRA, destacou os problemas que mais afetam os estudantes universitários na Sessão Solene de Abertura do Ano Académico 2022-2023. A Sessão realizou-se no dia 26 de outubro de 2022, pelas 17 horas, no Auditório da Reitoria, ao Colégio dos Jesuítas do Funchal.
Alex Faria, Presidente da Direção da ACADÉMICA DA MADEIRA, na Sessão Solene de Abertura do Ano Académico 2022-2023, realizada a 26 de outubro de 2022, no Colégio dos Jesuítas do Funchal.

Hoje, na sessão de abertura do novo ano académico, irei incidir em temas que tive oportunidade de abordar no encontro de líderes estudantis com Sua Excelência, o Sr. Presidente da República, no palácio de Belém, e que contou com as presenças da Professora Elvira Fortunato e do Professor Pedro Nuno Teixeira, que tutelam a pasta do Ensino Superior.

Começarei pela área da investigação. Por todo o mundo, as universidades e os seus centros de investigação destacaram-se na luta contra a pandemia. Foi um período em que a Ciência e a Tecnologia ganharam maior valor social em termos mundiais e o conhecimento científico testado e certificado se impôs à agenda política mais radical.

Na universidade portuguesa, como nas de outros países, a vertente do ensino encontra-se intrinsecamente ligada ao campo da investigação, através das Unidades de Investigação & Desenvolvimento, formando gerações de especialistas capazes de perpetuar o que foi descoberto, desenvolvido e aprendido, e de replicar a construção de novo conhecimento, com melhores respostas para os desafios que a humanidade irá enfrentar.

A investigação científica e a inovação tecnológica decorrem em diversos centros de Portugal. Neles se integram estudantes de licenciatura, mestrado ou doutoramento e muitos outros jovens investigadores ao abrigo de diversos programas ou projetos específicos. Os investigadores têm sofrido com a precariedade que os sucessivos governos têm imposto ao setor da investigação.

De acordo com dados da Direção-geral da Administração e do Emprego Público, os setores da saúde, da educação, do ensino superior, da ciência e da tecnologia concentram a maioria dos recrutados a termo, em cerca de 70 mil. Em dezembro de 2021, o ensino superior e a investigação somavam mais 1.675 vínculos precários do que o ano anterior, o que representa uma subida de 10,8%. Veja-se a desgraça dos que fazem o conhecimento científico: os governos têm o conhecimento estatístico, mas não têm a ciência de resolver o problema social.

“o ensino superior e a investigação somavam mais 1.675 vínculos precários”

A precariedade encontra-se bem patente na vida destes profissionais e pode perdurar anos nas suas vidas laborais, sem certeza de um fim digno quando se aposentarem. É fundamental que estes profissionais sejam valorizados, que vejam o seu trabalho dignificado e reconhecido pela tutela, através de um enquadramento laboral adequado, com uma proteção social no campo das contribuições para segurança social, ou com acesso adequado aos mecanismos de apoio e de proteção ao emprego, como ocorre noutros setores. O risco é a emigração e o sangramento de recursos humanos para outros países, quadros técnicos estes que tão grande investimento público, familiar e pessoal custaram na sua formação.

Falemos agora de custos de formação, de emolumentos. De forma particular e aliado ao ramo da investigação, a frequência de um doutoramento, para um estudante sem qualquer bolsa de investigação, representa um aumento no encargo pessoal e familiar pelos elevados valores da propina e pelas várias taxas inerentes à frequência deste terceiro ciclo de estudos do Ensino Superior. Para entregar uma tese, depois de anos de investimento, muitos estudantes deparam-se com taxas de admissão para as provas de Doutoramento. Estas são justificáveis? Não. Repito, não!
Em primeiro lugar, há uma disparidade dos valores cobrados na entrega das teses às universidades para defesa. Esta discrepância, motivada em razões Pascalianas, motivou a Associação dos Bolseiros de Investigação Científica a promover uma petição à Assembleia da República para legislar sobre este desaire.

Porque é que não se justifica pagar estas taxas?

A impressão das teses passou a ser opcional, visto que estes documentos são entregues digitalmente, logo sem custos. De igual forma, as deslocações dos júris, uma das grandes despesas das universidades, acabaram, uma vez que a defesa dos trabalhos finais pode ser realizada à distância, através das novas tecnologias. Além disso, é defendido que quaisquer outros encargos inerentes àquela taxa já devem ser cobertos pelo que se paga através das propinas, sem imputar mais custos aos estudantes já penalizados pelas dificuldades, financeiras e sociais, inerentes à execução dos seus trabalhos, especialmente na conjuntura atual.

Em suma, a constante evolução tecnológica a que assistimos exige o término desta taxa para as provas do terceiro ciclo de estudos e tal deveria estender-se aos restantes níveis do Ensino Superior. A discussão do Orçamento do Estado para 2023 é o momento certo para que o Governo possa dotar as Instituição das compensações necessárias para arcar com os custos que, neste momento, são pagos pelos estudantes e que representam um grave obstáculo à conclusão dos doutoramentos.

Falemos agora do alojamento estudantil.

Há muito que sabemos que o alojamento disponibilizado pelas Instituições de Ensino Superior aos seus estudantes é insuficiente, bem como que as alternativas existentes para os estudantes deslocados, no setor privado, praticam preços inflacionados pelos mercados de compra e arrendamento de imóveis, em quase todas as regiões do país.

Na UMa, a maior parte dos estudantes é oriunda da região, não existindo problemas de alojamento para os que residem na maior mancha urbana da Madeira, que é o Funchal e os seus concelhos vizinhos.

Porém o problema coloca-se quando falamos em estudantes provenientes de concelhos mais distantes, como a Calheta, os municípios da costa norte ou a ilha do Porto Santo. A somar a estes, há uma percentagem minoritária de alunos vindos de fora da Região (do Continente e dos Açores) ou ao abrigo de programas internacionais. Estes são os que mais necessitam de alojamento. A nossa residência universitária está completa e a UMa tem lutado para aumentar a sua capacidade de alojamento com a construção de um edifício no Campus Universitário de São Roque.

O Funchal é com certeza uma cidade vocacionada para acolher estudantes, pois além da construção de um novo hospital com vertente universitária, possui quatro Instituições de Ensino Superior a funcionar. Contudo há pouquíssimo alojamento para estudantes deslocados.

O custo do aluguer local está inflacionado pelo turismo, que apesar de ser uma economia vital da Madeira, não pode prejudicar outros setores, nem a população. No relatório publicado este mês de outubro pelo Observatório do Alojamento Estudantil, a capital madeirense é a quarta cidade com o preço médio de alojamento estudantil mais elevado do país. Senhoras e senhores, estamos apenas abaixo de Lisboa, do Porto e de Setúbal. Além disso, o Funchal verificou a segunda maior variação dos preços de habitação para os estudantes, num aumento de 22,1% relativamente ao relatório passado. É mais difícil alojar umas poucas centenas de universitários no Funchal do que dezenas de milhar de estudantes deslocados em Coimbra, em Braga, em Aveiro, na Covilhã ou em Évora, todas elas cidades com universidades enormes, comparadas à nossa e com melhor oferta, ainda que insuficiente.

“o Funchal verificou a segunda maior variação dos preços de habitação para os estudantes, num aumento de 22,1% relativamente ao relatório passado”

A construção da nova residência universitária da UMa ainda não tem contrato de financiamento. Esta prevê 200 novas camas, cada vez mais urgentes a uma universidade que tem ambições internacionalistas. Não nos podemos limitar a planos de remediação, a cada 10 anos, para atenuar a falta de acomodações dignas para os estudantes, sem que isso requeira um esforço suplementar para as suas famílias no aluguer de um quarto a preço de turista.

Devido ao evidente atraso na execução do Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior, temo que realmente o plano não será concretizado na totalidade e que em 2026 não teremos as mais de 15 mil camas necessárias, por todo o país, para colmatar a falta de investimento de décadas, numa oferta mais digna e acessível. Encorajo os presentes a imaginar como seria se um filho vosso, para estudar numa universidade, pagasse 500 euros/mês para dormir num sofá. Nenhum estudante aprende sem um descanso de qualidade.

“em 2026 não teremos as mais de 15 mil camas necessárias”

Por fim, gostaria de abordar o subfinanciamento da Universidade da Madeira. Foram várias as tentativas das Universidades da Madeira e dos Açores para a concretização de um contrato-programa para solucionar os vários problemas de ambas as instituições dado o seu carácter insular e periférico.

A Sr.ª Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior desde logo reconheceu, no parlamento nacional, existirem falhas no modelo de financiamento das universidades e dos politécnicos.

Deverá ser discutida, espero eu, em alguns meses, uma revisão do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior com todos os intervenientes, na qual presumo que estaremos integrados. Aí, será a oportunidade de nós, a Académica, a Universidade e a Região, lutarmos pela majoração de financiamento, para compensar os custos extraordinários da ultraperiferia e da insularidade, reforçando a coesão territorial e repondo direitos para promoção da igualdade de oportunidades entre as universidades do país.

“compensar os custos extraordinários da ultraperiferia e da insularidade”

O Governo da República continua a permitir que haja desigualdades graves no financiamento das diferentes IES, prejudicando, deliberadamente, as universidades públicas das Regiões Autónomas pela falta de majoração orçamental para compensar os sobrecustos decorrentes da situação insular e ultraperiférica. Conclusão, Lisboa dá à UMa e à UAç sempre arroz!

É indispensável um mecanismo de majoração que permita fazer face a custos extraordinários que outras universidades não têm.

Tudo isto não é novidade e é sabido pelo ministério, tanto no atual como em governos anteriores. Contudo, ambas as universidades insulares continuam, mês após mês, ou ano após ano, sem contratos-programas tripartidos com o Governo central e com os respectivos Governos Regionais, há muito solicitados, e sem garantias de resolução.

É preciso lutar pela UMa e pela Região. Trabalhemos juntos em prol do bem comum.

Viva a Região Autónoma da Madeira e viva a sua Universidade!

Bem-hajam!

Alex Faria
Presidente da Direção da ACADÉMICA DA MADEIRA
Com fotografia de Roberto Sousa.

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