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Crise política em Moçambique

A 5 de Outubro de 2017, numa pequena vila piscatória chamada Mocímboa da Praia, um grupo de indivíduos levou a cabo um ataque armado a um posto de polícia, do qual resultou a morte de 2 agentes. A imprensa local deu conta de que este ataque teria sido realizado por jovens locais, denominados de Al-Shabaab, o mesmo nome de um grupo terrorista que opera na Somália.

As razões que levaram este grupo a realizar ataques em aldeias e vilas na zona de Cabo Delgado podem ser divididas em 4 factores: políticos, económicos, sociais e religiosos. Apesar de ser uma zona com diversidade religiosa, sempre houve uma tolerância e pacificidade entre os locais. No entanto, nos últimos anos, com a chegada de estrangeiros radicais, originários do Estado Islâmico, essa situação mudou. Os recém-chegados começaram a isolar-se dos restantes, criando as suas próprias mesquitas e recrutando jovens descontentes com o desemprego, a pobreza e os abusos das autoridades. Aliado a isto está, também, o facto das águas desta zona serem extremamente ricas em gás natural, que consiste num dos grandes investimentos estrangeiros na África Subsariana, e a insatisfação da população por não retirar qualquer lucro disso.

Na sequência de um novo ataque a Mocímboa da Praia, em 2019, o autoproclamado Estado Islâmico reivindicou, pela primeira vez, a sua presença no país e qualificou-o como parte integrante do seu califado da África Central.

Em abril de 2020, de uma só vez, numa aldeia, foram mortas 52 pessoas nas mãos deste grupo terrorista. No final do mesmo ano, na aldeia de Muatide, um campo de futebol foi transformado num campo de execuções, onde, ao longe de 3 dias, mais de meia centena de pessoas foram decapitadas, incluindo crianças.

A 24 de março do presente ano, a empresa petrolífera “Total” iria recomeçar a sua atividade destinada à exploração de gás natural, na zona de Palma, quando se deu um novo ataque que espalhou o caos. No mesmo dia, cerca de 3 mil pessoas fugiram a pé e pelo mato para cidades vizinhas, mas o maior fluxo de desalojados chegou a Pemba, capital de Cabo Delgado, de barco, a uma distância de quase 400 km. Cerca de 200 pessoas refugiram-se num hotel local, Amarula. Numa tentativa de fuga, caíram numa emboscada que causou vários mortos e feridos, dos quais um cidadão português. Segundo o ministério da defesa moçambicano, dezenas de civis foram mortos. O movimento terrorista Estado Islâmico reivindicou o controlo da vila de Palma que, atualmente, já está outra vez sob controlo do exército moçambicano. Segundo relatos de habitantes locais, que admitem não voltar ali, quem disparava eram crianças. Este é considerado o ataque mais grave até ao momento.

Segundo estatísticas da ONU e de várias ONG’s, os ataques preconizados pelo grupo Al-Shabaab já provocou mais de 2000 mortos em, pelo menos, 838 incidentes violentos. Cerca de 700 mil pessoas perderam as suas casas e foram obrigadas a fugir. Mais de 1,3 milhões precisam de assistência humanitária urgente. A situação sanitária também se tem agravado devido a estes conflitos. Grande parte dos desalojados precisa de medicamentos e cuidados médicos, porque Cabo Delgado e 2 províncias limítrofes têm milhares de casos de cólera, sarampo e covid-19. A Amnistia Internacional condenou a violência deste grupo, no entanto também criticou o governo, acusando-o de combater a violência com atrocidades como tortura e perseguição.

Empresas estrangeiras do sector do gás, que estavam a investir bilhões nesta zona, estão agora a reduzir as suas operações devido à insegurança e à queda de preços.

Moçambique já está a receber ajuda estrangeira, nomeadamente dos Estados Unidos da América, da África do Sul e da União Europeia. Contudo este apoio é apenas para a formação dos militares, uma vez que o governo moçambicano recusa intervenção militar de outros países em combate.

Segundo diversos analistas, a solução para este conflito seria uma maior presença do Estado na região para lidar com os problemas económicos e sociais, nomeadamente uma maior igualdade de oportunidades de trabalho e participação no negócio do gás natural.

Desde o fim da guerra civil, em 1992, que Moçambique não assistia a uma crise humanitária como a atual.

Mafalda Andrade
Aluna da UMa

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