Inquérito revela aumento de problemas de saúde mental entre estudantes universitários

Inquérito revela aumento de problemas de saúde mental entre estudantes universitários

O número de estudantes do ensino superior que reportam sofrer de problemas de saúde mental em Portugal duplicou nos últimos anos. Ansiedade e depressão continuam a ser as condições mais relatadas pelos estudantes.

Trata-se da conclusão do Inquérito às Condições Socioeconómicas e Académicas dos Estudantes do Ensino Superior, apresentado pela Direção-geral do Ensino Superior (DGES), na passada quinta-feira, dia 18 de setembro.

O estudo contou com a participação de 10.600 estudantes, representando um universo de cerca de 420 mil alunos inscritos em instituições de ensino superior portuguesas no ano letivo de 2022-2023. Segundo o relatório, 9% dos inquiridos confirmaram enfrentar problemas de saúde mental, o que representa um aumento significativo em relação aos 4,4% reportados no inquérito anterior, realizado no ano letivo 2020-2021.

Para Susana da Cruz Martins, professora no ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa e coordenadora deste inquérito, este aumento significativo acompanha uma tendência europeia, refletida também pelo projeto Eurostudent, que analisa a qualidade de vida dos estudantes universitários em vários países. Estes resultados, surgem parcialmente “na sequência dos contextos vivenciados com a pandemia de covid-19, de medidas que obrigaram a restrições nas relações sociais, que tiveram como propósito a contenção do vírus, mas que trouxe efeitos negativos com origem no isolamento e distanciamento social muito sentidos nesse período”, reflete a investigadora.

Os problemas de saúde mental mais frequentemente relatados pelos estudantes são o transtorno de ansiedade e a depressão, que afetam a vida académica e social de quem lida com esses desafios. Contudo, apesar do aumento de relatos, muitos estudantes não consideram o impacto da psicose e comportamentos aditivos como prejudiciais ao seu percurso académico, um dado que o estudo considera relevante.

O inquérito destaca que quase dois terços dos estudantes (59%) consideram os apoios existentes para saúde mental totalmente insuficientes. Apenas um quinto dos inquiridos sente que as medidas disponíveis são adequadas às suas necessidades. Em resposta a este cenário, o Governo lançou uma iniciativa que permitirá aos estudantes universitários aceder a consultas de psicologia e nutrição a partir de outubro, através de um programa de cheque-psicólogo, que oferece um total de 100 mil consultas de psicologia, além de 50 mil de nutrição.

Na assinatura dos protocolos com as ordens dos nutricionistas e psicólogos, a Ministra da Juventude e Modernização, Margarida Balseiro Lopes, revelou que os cheques estarão disponíveis a partir de 30 de setembro e que o pedido de consulta poderá ser feito através do portal Gov.pt. Esta medida, que conta com a adesão de todas as instituições de ensino superior do país, visa disponibilizar apoio psicológico e nutricional a partir de uma rede de 297 psicólogos e 208 nutricionistas.

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Para o bastonário da Ordem dos Psicólogos, Francisco Miranda Rodrigues, apesar de a medida ser um avanço, esta deve ser vista como “uma resposta complementar e temporária”. O Psicocólogo defende a necessidade de uma resposta “mais robusta, desde logo no SNS”, para garantir que os estudantes recebam o apoio adequado.

O inquérito também revela que as questões de saúde mental estão profundamente interligadas com as desigualdades presentes no ambiente universitário. Os estudantes enfrentam barreiras financeiras, de género, raciais e de orientação sexual que afetam o seu bem-estar. Mais de 8% dos participantes relataram experiências de discriminação em relação ao género, peso, nacionalidade e condição financeira.

“As estudantes mulheres declaram ser mais objecto de discriminação do que os homens, sobretudo por via do género, mas também devido ao seu peso, ou por problemas de saúde mental, ou devido aos seus rendimentos”, aponta o relatório. Já os homens reportaram experiências de discriminação mais associadas à sua sexualidade ou orientação sexual.

As consequências destes desafios se refletem nos números de abandono do ensino superior. Um outro inquérito realizado pela Federação Académica de Lisboa, de 2023, conforme noticiado pelo Público, indicou que 23% dos estudantes consideraram desistir dos seus estudos, com 62% referindo questões de saúde mental como uma das principais razões. A Federação Académica do Porto (FAP) também expressou preocupação com este fenómeno, destacando que o abandono é frequentemente causado por uma combinação de dificuldades socioeconómicas e problemas de adaptação ao ensino superior.

Para Francisco Porto Fernandes, presidente da FAP, é fundamental que o ensino superior esteja mais “centrado no estudante, com menos carga horária, com um nível de ensino-aprendizagem digno do século XXI”, criando-se um ambiente de estudo mais inclusivo e sustentável para os jovens que enfrentam os desafios atuais.

Carlos Diogo Pereira
ET AL.
Com fotografia de Kristina Tripkovic.

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