Vivemos numa era em que o acesso à educação superior é crucial. Infelizmente persistem alguns entraves aos jovens na realização dos seus cursos, especialmente no que toca à atribuição de bolsas de estudo.
No verão de 2023, houve uma mudança na definição do conceito de agregado familiar, plasmado no regulamento que gere a atribuição de bolsas de estudo do Estado português. Trata-se de uma alteração na redação que, apesar de curta, gerou complicações significativas na vida de alguns estudantes em Portugal. A adição da conjunção “ou” na definição da condição de composição do agregado familiar no Regulamento de Atribuição de Bolsas, exige a verificação de apenas uma das três condições indicadas na versão anterior do documento – mesa, habitação e rendimento – basta para que seja aplicado o termo família. Esta mudança, contudo, ao facilitar a exclusão de candidatos à bolsa por capitação de outros elementos, revela-se um verdadeiro problema. Se um estudante vive com os avós ou com os tios, apenas por proximidade da sua universidade, o rendimento destes familiares, mesmo que não tenha relação com o financiamento do estudante, passa a ser, pelo regulamento, considerado para efeitos de candidatura a bolsa, situação que antes do aparecimento do “ou” não se colocava.
A alteração realizada pela tutela pode prejudicar e excluir muitos estudantes que, de outra forma, apresentariam condições para beneficiar de bolsa. Perante este problema, o Conselho de Associações Académicas Portuguesas decidiu solicitar ao Ministério a revisão da alteração deste artigo, num apelo à justiça social. A revisão do documento proposta pelas Associações Académicas busca soluções para os casos que têm chegado diariamente às instituições de ensino, numa resposta fundamentada e organizada a um problema emergente que afeta a equidade no acesso à educação superior.
É crucial reconhecer que a capitação, como principal razão para a privação de acesso à bolsa estatal, não reflete adequadamente as realidades económicas dos estudantes. Esta métrica, muitas vezes, deixa de lado nuances e dificuldades individuais que podem influenciar significativamente a capacidade financeira de um estudante para prosseguir os seus estudos. Numa sociedade que valoriza a educação como um motor de progresso, é imperativo que os sistemas de apoio estejam alinhados com o princípio fundamental da igualdade de oportunidades. A revisão deste artigo transcende a esfera técnica, trata-se, antes, de uma questão de justiça. É uma afirmação de que todos os estudantes, independentemente das suas condições económicas, têm igual direito a uma oportunidade de tirar um curso superior.
Ricardo Freitas Bonifácio
Presidente da ACADÉMICA DA MADEIRA.
Com fotografia de Sandy Millar.