Imprensa Académica lançou uma obra inédita sobre o “25 de Abril” na Madeira

Baseada na tese de doutoramento de Bernardo Martins, defendida na Universidade da Madeira, esta é uma análise dos acontecimentos de uma época que mudou o rumo da história, à luz da imprensa regional. "Finalmente, vem a lume uma monografia histórica sobre o 25 de Abril na Madeira", refere Nelson Veríssimo, historiador.
Sessão de apresentação de “25 DE ABRIL” NA MADEIRA: TENSÕES SOCIAIS E POLÍTICAS EM 1974-75, À LUZ DA IMPRENSA REGIONAL, da autoria de Lino Bernardo Calaça Martins, no Colégio dos Jesuítas do Funchal. A obra é uma edição da IMPRENSA ACADÉMICA, uma chancela editorial da ACADÉMICA DA MADEIRA.

O “25 de Abril” na Madeira: Tensões sociais e políticas em 1974-75, à luz da imprensa regional é o primeiro trabalho histórico com rigor académico e científico realizado sobre a Revolução do 25 de Abril na Madeira. A obra constitui, com ligeiras alterações, a tese de doutoramento Bernardo Martins em Ilhas Atlânticas: História, Património e Quadro Jurídico-Institucional, que foi defendida à Faculdade de Artes e Humanidades da Universidade da Madeira (UMa), orientada pelo Doutor Nelson Veríssimo, e cujas provas públicas decorreram em fevereiro de 2023.

O volume, com chancela editorial da IMPRENSA ACADÉMICA, conta com o apoio da Câmara Municipal de Machico. O lançamento decorrerá na Sala dos Atos Padre Manuel Álvares no Colégio dos Jesuítas do Funchal, Reitoria da UMa, a 13 de abril, pelas 18.30.

Será apresentado no Salão Nobre dos Paços do Concelho de Machico no dia 29 de abril, a partir das 18.00, no âmbito das comemorações municipais do 50.º aniversário da Revolução dos Cravos.

Fale-nos um pouco do seu percurso, político e académico, até este momento que é o da publicação da sua tese de doutoramento.

B.M.: De forma sintética, diria que passei de estudante a professor nalgumas escolas da Madeira (Machico, Ribeira Brava e Liceu Nacional do Funchal), tendo feito a licenciatura em História na Universidade de Coimbra. Depois, exerci diversas atividades políticas e públicas, nomeadamente como presidente da Junta de Freguesia de Machico, presidente da Câmara Municipal de Machico e deputado da Assembleia Legislativa da Madeira. Em seguida, voltei à escola, ou seja, fiz o mestrado em Estudos Regionais e Locais e o doutoramento em Ilhas Atlânticas: História, Património e Quadro Jurídico-Institucional, ambos os cursos na Universidade da Madeira.

Apoiando-se sobretudo na imprensa escrita da época, cujos exemplares estão depositados no Arquivo e Biblioteca da Madeira e podem ser consultados online pelos leitores, o autor conseguiu uma recolha importantíssima de documentos que são hoje muito difíceis ou impossíveis de encontrar, como por exemplo, os comunicados de partidos, sindicatos, associações e grupos de cidadãos, que
foram publicados integralmente nas páginas dos jornais. A partir da recolha e da análise deste material, Bernardo Martins conseguiu construir um relato e retrato históricos de muito rigor para a compreensão do debate e das lutas políticas durante o período revolucionário na Madeira.

Como vê a edição para o grande público de um trabalho académico? O que espera desta sua publicação?

B.M.: A pretensão deste trabalho académico é contribuir para um melhor conhecimento científico e a compreensão histórica do “25 de Abril” na Madeira e no Porto Santo, tendo em consideração a existência de poucos estudos sobre esta temática a nível regional. A sua difusão é igualmente uma forma de estimular novas investigações, trabalhos de nível académico, como também de muitos cidadãos que poderão e deverão divulgar os seus testemunhos, memórias e reflexões sobre esta data histórica e relevante para a vida da população do arquipélago.

Para Nelson Veríssimo, prefaciador e orientador esta tese de doutoramento vem derrubar “uma espécie de barreira que, se não impedia, pelo menos não incentivava o estudo de um período revolucionário, no qual se forjaram as mudanças estruturais da sociedade madeirense contemporânea”. De facto, a leitura da obra permite conhecer melhor a transformação socioeconómica, política e cultural da Madeira que se deu com o fim do Estado Novo por causa da Revolução do 25 de Abril de 1974.

O pouco conhecimento, ou mesmo desconhecimento, do que foi o 25 de Abril na Madeira, pelos jovens ou até pelos menos jovens, pode ser ultrapassado por publicações como a sua? Que outras formas de dar a conhecer o passado seriam possíveis?

B.M.: Sim, impõe-se maior e melhor conhecimento da “Revolução dos Cravos”. O trabalho que tem sido promovido pelos professores nas suas escolas deve ser ampliado e complementado com mais conferências, conversas e debates, dando oportunidade a testemunhos do período revolucionário. Obviamente, que a publicação de trabalhos académicos é fundamental para a divulgação do património de Abril junto dos mais novos. Paralelamente, seria interessante produzir publicações de cariz infanto-juvenil, de modo a tornar mais acessível e apelativa a formação deste segmento populacional, que deve continuar os valores do “25 de Abril”.

A obra descreve as movimentações populares e as dinâmicas associações e movimentos de cidadãos, a ação dos órgãos de poder e as suas alterações estruturais, a atitude da Igreja Católica, comprometida politicamente com a direita conservadora, a ação dos partidos políticos e dos meios de comunicação social, não esquecendo os atos terroristas ocorridos e as reivindicações da autonomia.

Neste ano em que se comemora os 50 anos do 25 de Abril, a pergunta é inevitável: cumpriu-se o 25 de Abril na Madeira?

B.M.: Na Madeira, houve consequências extremamente positivas do “25 de Abril”, como a liberdade, a democracia, a extinção da colonia, a dignificação dos grupos socioprofissionais, a criação das juntas de freguesia, a instituição da autonomia política e o desenvolvimento económico-social (fruto da entrada de Portugal na União Europeia, de que resultou o seu apoio financeiro, mas só possível com o “Movimento dos Capitães”). Se se diz que os ideais da “Revolução Francesa” (1789) – Liberdade, Igualdade e Fraternidade – continuam a ter necessidade de se aperfeiçoarem e até mesmo se implantarem nalgumas partes do Mundo, também os valores da “Revolução dos Cravos” (1974) precisam de ser defendidos, ampliados e reforçados a nível nacional, e nomeadamente na Região Autónoma da Madeira. Obviamente, continuar a cumprir Abril é uma tarefa essencial dos cidadãos, das organizações sociais, dos sindicatos, das instituições político-administrativas, das escolas, das universidades, dos partidos políticos, ou seja, de cada um de nós. Cumprir Abril impõe-se como uma acção permanente, persistente e crescente na Madeira e Porto Santo.

Entrevista conduzida por Timóteo Ferreira.
ET AL.
Com fotografia de Henrique Santos.