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“Drogas leves” e consequências pesadas

“(…) Tenho 35 anos e decidi partilhar alguns pontos da minha vida na esperança que muitos jovens não sigam as minhas pisadas. (…) Com 21 anos casei, já tinha carro e comprei casa. A minha ex-mulher estava grávida do meu filho, tudo me corria bem, era feliz, tinha muitos amigos e uma vida social ativa. Sempre adorei futebol, principalmente ver os jogos do meu clube do coração era uma presença assídua em todos os encontros. Foi neste contexto que um dia, um amigo que me acompanhava me ofereceu um charro para fumar. Num primeiro momento disse-lhe que não, ele insistiu, disse que ia ficar “zen”, voltei a dizer que não, ele acendeu um para ele, voltou a insistir, acabei por aceitar e dar uma passa. (…) Foi nesse dia, com 22 anos, que começou a minha autodestruição. Sempre que ia ver um jogo do meu clube fumava um charro. O consumo desta droga começou de forma ocasional e esporádica, passou a regular, depois a frequente, a diária e por fim já consumia várias vezes ao dia. Com 23 anos, novamente durante um jogo de futebol, fumei um pouco demais. Durante o jogo senti-me mal, comecei a ficar com os meus sentidos muito apurados, o som era ensurdecedor, tinha a sensação que toda a gente olhava para mim e queriam fazer-me mal. Já não consegui trazer o carro, quando cheguei a casa fechei-me no quarto durante dois dias, não queria falar nem ver ninguém, apenas rezava e queria que aquele mau estar desaparecesse. Com o passar do tempo comecei a sentir um cheiro permanente a podre, um cheiro que só eu sentia. (…) Com o passar do tempo o cheiro a podre começou a ser acompanhado por vultos de familiares que já tinham falecido. Estava cheio de medo, por vezes não queria dormir, outras vezes não conseguia, recusava-me a sair do quarto, passava os dias e as noites a rezar e a acender velas pelos meus familiares, queria que me deixassem em paz, mas isso não acontecia, até que um dia, chegou a minha casa a polícia e o INEM, fui internado compulsivamente. (…) Em 2 anos tive cerca de 30 tentativas de suicídio e outros tantos internamentos em Psiquiatria. Num desses internamentos o Médico Psiquiatra que me acompanhava disse-me que já não tinha uma psicose tóxica, mas sim Esquizofrenia Paranóide, uma doença crónica que não tem cura, mas sim tratamento. Que ia piorar com o tempo se não parasse de fumar canábis” (…) António (nome fictício), in revista dependências, fevereiro de 2016. Serve este testemunho para alertar as consciências daqueles que desconhecem ainda o perigo do consumo da canábis. Estão a aparecer nas urgências dos hospitais, psicoses agudas e esquizofrenias, desencadeadas por estes consumos, evidenciando a perigosidade, associada ao aumento do teor de THC (tetrahidrocanabinol), obtido através de novas técnicas de cultivo. Há muitas ideias erradas que circulam por aí e que é preciso esclarecer e a melhor arma de prevenção começa pela informação. Artigo elaborado ao abrigo do protocolo com a Unidade Operacional de Intervenção em Comportamentos Aditivos e Dependências – UCAD | IASAÚDE, IP-RAM. Idalina Sampaio Socióloga

A inacção estudantil

Recentemente, em encontros das associações estudantis portuguesas, a AAUMa logrou aprovar duas importantes propostas, uma relativa à redução do custo dos transportes públicos para universitário e outra à redução das despesas assumidas aquando da impressão de cópias excessivas de teses, dissertações para obtenção de títulos académicos. Quantos, de entre os estudantes do Ensino Superior, deram importância a tal? Um enorme cartaz, no Campus da Penteada, sugeria aos estudantes que reclamassem, caso os prazos das avaliações não fossem cumpridos. Quantos lhe deram atenção? Espero que tenham sido muitos. O défice de espírito crítico dos estudantes universitários portugueses é crescente e está directamente relacionado com o fechamento dos mesmos a tudo o que não diga respeito aos seus estudos, uma atitude que se propaga na sociedade, criando cidadãos apáticos. Não há interesse em participar no bom funcionamento de cursos e instituições, ou em qualquer movimento estudantil legítimo: associações estudantis, tunas, etc. Parece que só a praxe os motiva para além das avaliações obrigatórias ou os jogos de cartas das horas vagas. De certa forma, há uma falta de encorajamento na cultura portuguesa ao voluntariado e ao extracurricular. Essas questões são menos valorizadas em Portugal do que noutros países europeus. Qual é o problema deste desinteresse? Do ponto de vista institucional, visto que certos órgãos de gestão e pedagógicos das universidades incluem estudantes, a falta deles causa um desequilíbrio de poderes entre docentes e discentes. Os estudantes perdem capacidade de actuação e as instituições perdem retorno e deixam de conhecer a realidade das suas salas de aula. A situação é pior na relação com os antigos alunos, que podendo serem mecenas da Instituição ou serem os primeiros a darem informações sobre a relação universidade-mercado de trabalho, deixam de ter qualquer préstimo útil. Perdem-se informações de adequação de currículos a nichos laborais aos quais se destinariam os cursos e muitas unidades curriculares tornam-se obsoletas, importando apenas ao docente que a lecciona. Se o estudante pensa que tal não o afecta directamente, desengane-se. Todos os anos saem das universidades centenas (ou mesmo milhares) de engenheiros (por exemplo), cujos currículos diferem, basicamente do prestígio da universidade, da nota de conclusão e da originalidade do seu trabalho final. Os seus cursos, controlados ministerialmente, torna-os licenciados ou mestres semelhantes entre si. Como é que num mar de gente com a mesma formação podemo-nos fazer destacar? Resposta: apostar em actividades e formação extracurricular. Cada vez mais empresas preferem estudantes que se tenham envolvido em associações estudantis ou outras. São entidades os seus candidatos mostram que desenvolveram competências diferentes. Por toda a UE o associativismo, o Erasmus+, o voluntariado são razões para escolher uns em detrimento de outros. Se és estudante universitário, investe no extracurricular. Exige da tua Universidade e prova que és e serás sempre um cidadão consciente. Carlos Diogo Pereira Alumni

A ciclicidade dos tempos

“Assim, é possível relacionar as tendências e a ciclicidade histórica, com o erro humano, que faz com que os tempos sejam sempre os mesmos, acompanhados de crises e de prosperidades” A vida além de efémera é também cíclica, o que faz com que tudo o que se inclui nela também o seja, como tal temos o exemplo das tendências, da moda, da música e outras artes, dos hábitos e das tradições. É através do antigo e do que já foi feito, que os artistas e modistas acabam por encontrar inspiração para se reinventarem, de modo a criarem algo diferente e que desperte interesse aos olhos do público. Este género de acontecimentos é muito comum na indústria da moda, o que faz com que um artigo de roupa que esteja “in” numa determinada estação, volte sempre a estar na moda novamente, após um determinado período de tempo. A música é capaz de influenciar e mover multidões, assim ao observar-se a evolução da mesma, a verdade é que caminhamos cada vez mais para um género musical mais moderno e tecnológico, no entanto e devido à quantidade afluente destes géneros musicais, acabam por aparecer grupos musicais com sucesso, devido ao facto de apresentarem géneros musicais diferentes, novos, que no entanto não são novos mas sim repetidos de outras décadas, como é o caso do rock, da mistura entre música clássica e pop, entre o jazz e o rock, entre outros géneros. Desta forma as tendências são influenciadas pela política, pela economia e pelas exigências do público, um dos exemplos desta influência, é o de que antigamente o pão e o leite eram vendidos de porta a porta, no entanto e com o aparecimento de superfícies comerciais e com atendimento ao público, acabou por haver uma supressão da necessidade de entregas. Actualmente, a realidade é que existem cada vez mais empresas que estão a reinventar esta técnica de entregas de modo a recolherem mais clientes e obterem um aumento da rentabilidade económica. Assim, é possível relacionar as tendências e a ciclicidade histórica, com o erro humano, que faz com que os tempos sejam sempre os mesmos, acompanhados de crises e de prosperidades. Individualmente a realidade é que o esperado, é a aprendizagem através dos nossos erros, contudo caímos novamente no erro e repetimos a mesma atitude vezes e vezes sem conta, criando um ciclo que se reflecte na história da humanidade, influenciando desta forma, os hábitos, as tradições e a moda de um povo. A ciclicidade dos tempos age de forma a manter a história e a cultura viva de um povo, no entanto devido à modernização dos tempos, existem diversos tipos de heranças culturais que estão progressivamente a desaparecer, o que faz com que o trabalho dos historiadores e estudiosos que abordam estas temáticas seja fundamental na preservação do património cultural, que é realizada através da escrita de textos, livros e elaboração de estudos e recolhas. Assim os ciclos históricos, fazem com que diariamente façamos uma viagem temporal, entre o passado e o presente, numa junção entre o feito, o refeito e o reinventado, numa mutação do antigo com o moderno, fazendo com que no fundo a base da tendência ou da moda seja, o passado com características do presente, que procura o futuro. Ester Caldeira Estudante da UMa

Um madeirense em Barcelona

A minha aventura no Serviço Voluntário Europeu (SVE) foi motivada, fortemente, pelo facto de ter acabado a licenciatura e de sempre ter vivido na Madeira. Consciente de que precisava de me habituar à ideia de partilhar apartamento ou até a viver sozinho, achei esta experiência um bom “treino” para quando ingressar no Mestrado, fora da Região. A escolha do projecto não foi imediata, tendo-me candidato a vários, todos eles em Espanha. Com o apoio da Associação Académica da UMa, acabei por optar por um trabalho em torno de pessoas com necessidades especiais, numa província de Barcelona. Inicialmente, devo confessar que não tinha esperança de ficar colocado, uma vez que a minha área de estudos é um pouco distinta, à primeira vista, da acção para a qual me candidatava. Tive uma formação a respeito do SVE, na qual eu era o único português. Éramos cerca de 30 que partiríamos à aventura e participamos nesta iniciativa em Girona, uma cidade fantástica onde gravaram cenas de Game Of Thrones e do filme Perfume. Àqueles que são fãs da série e do filme, aconselho, mesmo, a visitarem a cidade. Estou há alguns meses em Barcelona e a experiência tem sido muito gratificante! Estava com algum receio pois nunca tinha lidado com pessoas com necessidades especiais mas a verdade é que tenho conseguido desmistificar esta ideia e esta realidade. Aqui na função espanhola AMPANS (Asociación Manresana de Padres de Niños Subdotados), onde faço voluntariado, existem pessoas com vários graus de deficiência. Algumas são completamente autónomas e outras precisam, de facto, de alguma ajuda para executar algumas tarefas. Tenho recebido imenso carinho e afecto por parte dos usuários e monitores dos lares por onde trabalho e o que me satisfaz mais é poder ajudá-los em coisas que para mim são perfeitamente normais e banais, mas que para eles são um pouco difíceis de realizar. Ver o enorme sorriso após terem superado as dificuldades não tem explicação! O Serviço Voluntário Europeu tem tido um grande impacto em mim, tanto a nível pessoal como profissional. Quando cheguei a Barcelona mal falava espanhol e trauteava meia dúzia de palavras em inglês! Sempre fui meio tímido, mas com o SVE sinto-me confiante e falo com fluência tanto o espanhol como o inglês. Também tem servido para ter noção de como gerir uma vida sozinho: equilibrando os gastos, de modo a poder fazer face às minhas necessidades e, ainda, aproveitar para viajar e conhecer alguns locais próximos. Filipe Afonso Voluntário do programa Erasmus+

Bruges

“DE MOCHILA ÀS COSTAS” Situada no norte da Bélgica, Bruges foi considerada Capital Europeia da Cultura em 2002, e o seu centro cultural é considerado Património da Humanidade desde 2000, uma vez que manteve os seus prédios medievais. Ao chegar a esta cidade, deparamo-nos com a sua beleza ímpar que tanto a caracteriza: os canais que a atravessam e que, consequentemente, a tornam conhecida como “Veneza do Norte”. Deste modo é imperioso dar um passeio de barco, que possibilita ver a cidade de um ponto de vista diferente. Os edifícios medievais fizeram-me dar asas à imaginação, com a sensação de uma viagem ao passado. Num passeio a pé, foi possível contemplar diversos dos seus edifícios históricos e, de certa forma, ajuda a camuflar as baixas temperaturas que se fazem sentir. Foi em Bruges que senti verdadeiramente o espírito natalício me invadir. A Grote Mark estava repleta de barracas de comes e bebes e tinha, ainda, uma pista de patinagem no gelo. A simpatia dos locais era contagiante e o cheiro do chocolate e dos waffles fazia-se sentir por toda a praça. Bruges é perfeita para quem gosta de fotografia e dá a sensação de estar dentro de um postal. É uma cidade pequena que tem muito para oferecer e não me deixou desiludida. Apesar de ter tido apenas um dia para a visitar, fiquei com o desejo de lá voltar e, definitivamente, saí de lá enriquecida. Afinal, é esse o meu objetivo ao viajar. Até um dia, Bruges! Célia Andrade Alumni

Trabalhadores-estudantes: uma questão de tempo (?)

O fundamental é atingir um equilíbrio entre as responsabilidades académicas, profissionais e pessoais, através de uma gestão eficaz de tempo. Estudar e trabalhar em simultâneo é uma realidade cada vez mais comum em Portugal, quer seja pelo desejo de ganhar experiência profissional ou pela necessidade de ter uma fonte de rendimento extra, que permita ajudar a pagar os estudos e despesas correntes. Há por isso um crescente número de indivíduos que concilia a sua vida académica com a vida laboral. De igual modo, é cada vez mais frequente existirem indivíduos, que se encontrando a exercer determinada profissão, optam por retomar os estudos. São diferentes os motivos que levam a tal opção, tais como aprofundar os conhecimentos numa determinada área, mudar de profissão, progredir na carreira, entre outros. Ao existir esta coexistência de estudo – trabalho podem surgir algumas dificuldades. A gestão do tempo é um dos maiores desafios para os trabalhadores-estudantes e não decorre exclusivamente do facto de haver muitas coisas para fazer ao mesmo tempo. As dificuldades surgem sobretudo por não haver uma adequada gestão do tempo que permita realizar tarefas mais importantes/prioritárias, nos momentos em que se está mais produtivo. Sendo o tempo um recurso precioso e escasso, saber como geri-lo revela-se como essencial para obter sucesso. Desta forma, deve haver uma organização entre o tempo de estudo e de trabalho em função das prioridades e obrigações. O fundamental é atingir um equilíbrio entre as responsabilidades académicas, profissionais e pessoais através de uma gestão eficaz de tempo. E como gerir o tempo eficazmente? – Analisar a forma como utilizamos o tempo (anotar durante 3 dias todas as tarefas realizadas e o tempo despendido para cada uma delas); – Elaborar e gerir horários e organizar o tempo de estudo (fazer horários semanais com as tarefas a realizar e cumpri-las); – Estabelecer objetivos a curto, médio e longo prazo (“O que quero atingir esta semana? Este mês? Este semestre?”); – Saber definir prioridades (“O que é urgente? O que é importante?”); – Manter a motivação através de uma adequada distribuição das atividades (ou seja, agrupar atividades semelhantes; aproveitar os tempos de espera para realizar pequenas tarefas; respeitar o seu ritmo biológico de forma a rentabilizar o tempo de produção); – Aprender a lidar com a procrastinação, que consiste no adiamento sucessivo de tarefas (Para tal importa definir objetivos realistas; criar listas de tarefas a fazer; dividir os objetivos mais complexos em tarefas de menor dimensão; começar a tarefa usando a regra dos 15 minutos – comprometendo-se a realizar a tarefa durante este tempo; começar pela parte mais fácil ou mais agradável da tarefa; manter a organização da área de trabalho; planear recompensas após a concretização de cada tarefa definida). Por tudo isto, apesar da multiplicidade de tarefas inerentes às diversas esferas da vida do indivíduo, ao serem adotadas algumas estratégias de planeamento e organização de tempo, bem como uma atitude de perseverança e de otimismo, o caminho para o sucesso poderá ser garantido! Jennire Gonçalves Estagiária curricular do Serviço de Psicologia da UMa

“A César o que é de César…”

O título deste texto é, como se sabe, parte da resposta proferida por Jesus Cristo quando questionado, de forma provocatória, sobre a legitimidade de pagar tributo a Roma. Terá dito mostrando a efígie do imperador numa moeda romana: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.” O César representado na moeda era provavelmente Tibério, que por adopção herdara o cognome Caesar do seu padrasto, ele próprio também César por adopção. Na origem, Caesar é cognome da família de Gaio Júlio César, célebre general e estadista romano, conhecido entre os mais novos principalmente graças às aventuras de Astérix e Obélix, e provavelmente uma das personagens mais conhecidas da história romana. Conhecida e citada! Todos nós já alguma vez usámos uma das suas célebres frases: “Cheguei, vi e venci!” (em Latim, veni, vidi, vici) ou “Os dados foram lançados” (Alea iacta est), a primeira usada para demonstrar a extrema facilidade de uma conquista, a segunda usada no contexto de uma situação que é irreversível. Outras expressões que a César devemos serão menos conhecidas mas o seu uso é frequente. Lembremos a tantas vezes mencionada mulher de César, a quem não basta SER séria, é preciso PARECER séria. Poucos, ainda assim, saberão que a expressão – que valoriza a imagem e a aparência, acima da essência – tem origem num episódio da vida conjugal de César. Numa festividade religiosa reservada às mulheres, em honra da Bona Dea, uma deusa associada à fertilidade, e celebrada a 3 de Dezembro, foi detectada a presença de um homem, Clódio, na casa de César, o que levantou suspeitas acerca do comportamento da então esposa de César, Pompeia. Foi Aurélia, a mãe de César e sogra de Pompeia, quem se apercebeu do intruso (por esta razão, sabemos que César não pode ter nascido de cesariana, já que a mãe não teria sobrevivido, na altura, a uma intervenção deste tipo)… Espalhado o boato, que foi aproveitado pelos inimigos políticos quer de César quer de Clódio, meses depois e já divorciado de Pompeia, ao perguntarem a César em tribunal por que razão se divorciara da esposa, terá dito, de acordo com Plutarco: “porque considerei que a minha esposa não deve suscitar suspeitas”. Quer se tivesse tratado de uma estratégia política, quer tivesse sido uma justificação conveniente para o divórcio, o que é certo é que para a esposa de César nunca mais foi suficiente ser moralmente correcta. A César devemos também a ideia de que as pessoas acreditam naquilo que querem, tenham ou não razões para o fazerem. A ideia aparece numa das suas obras, A guerra das Gálias (homines id quod volunt credunt). Trata-se, na verdade, de um comentário a uma estratégia militar: César convenceu um gaulês apoiante dos romanos a fingir-se desertor e a transmitir aos gauleses a ideia de que os romanos enfrentavam grandes dificuldades. Entusiasmados com estas falsas notícias, os gauleses, sem questionarem a veracidade das informações, atacaram os romanos que, obviamente, os esperavam e os venceram. Ficou a expressão, como um aviso contra as “inverdades” e contra os “factos alternativos”… Cristina Santos Pinheiro Professora da UMa e investigadora do UL-Centro de Estudos Clássicos

Características da Investigação Científica

A investigação tem dado um importante contributo ao desenvolvimento da humanidade. Fortin (2003), no seu livro sobre “o processo de investigação” diz-nos que a investigação científica é um processo que nos ajuda a resolver os problemas ligados ao conhecimento dos fenómenos do mundo que nos rodeia. Podemos dizer que a investigação científica é um método de aquisição de conhecimentos e uma forma ordenada e sistemática de encontrar respostas para questões que necessitam de uma investigação. De todas as outras formas de aquisição de conhecimento como sejam a intuição, a tradição, a autoridade, a experiência pessoal etc. a investigação científica é o método mais rigoroso e mais aceitável. Kerlinger (1986) apresenta a seguinte definição: “Scientific research is systematic, controlled, empirical, and critical investigation of natural phenomenon guided by theory and hypotheses about the presumed relations among such phenomena (p. 10)”. Dado que definições deste género são bastante abstratas, apresentam-se algumas características importantes da investigação: a) A investigação é direcionada para a solução de um problema. O grande objetivo é descobrir relações de causa e efeito entre variáveis. b) A investigação foca-se no desenvolvimento de generalizações, princípios ou teorias que serão muito úteis na previsão de futuros fenómenos ou ocorrências. c) A investigação é baseada em experiências observáveis ou evidência empírica. Determinadas questões interessantes não derivam em procedimentos de investigação porque não podem ser observadas. d) A investigação exige conhecimento. O investigador sabe já o que é conhecido acerca do problema e como os outros o investigaram. O investigador reviu cuidadosamente a literatura relacionada e conhece bem a terminologia, os conceitos, as técnicas necessárias para a compreensão e análise dos dados. e) A investigação é caracterizada por uma atividade paciente e vagarosa. Raramente é espetacular, e os investigadores podem possivelmente esperar desilusão e desencorajamento na prossecução das respostas para questões difíceis. A investigação tem dado um importante contributo ao desenvolvimento da humanidade. Facilmente reconhecemos os frutos da investigação: melhores produtos consumíveis, melhores maneiras de prevenir e curar doenças, melhor compreensão de grupos e indivíduos e melhor compreensão do mundo no qual vivemos. Referências Fortin, M. (2003). O processo de investigação: Da concepção à realização. Loures: Lusociência. Kerlinger, F. (1986). Foundations of behavioral research. New York: Hartcourt Brace Publishers. António Bento Professor da UMa

Quinta Magnólia

A Quinta Magnólia foi um dos centros de lazer mais importantes dos finais do século passado, com um complexo de piscinas e de cortes de ténis, que foram emblemáticos do desporto regional desses anos. Era, de início, uma quinta madeirense tradicional dos inícios do século, com residência, jardim e parque, que, progressivamente foi aumentada nas primeiras décadas desse século com o espaço das quintas anexas. Veio a transformar-se num clube privado e a ser, depois, um dos principais espaços desportivos da cidade do Funchal. O núcleo inicial constituiu-se nos finais do séc. XIX e foi passando depois por vários proprietários. Em 1910 e segundo a planta dos irmãos Trigo, publicada como anexo ao Roteiro do Funchal, ainda não teria o espaço que hoje ocupa, nem a residência que chegou aos nossos dias e que parece ter sido construída na década seguinte. Com as transformações urbanísticas da cidade e a reformulação do antigo caminho dos Carvalhos, que passou a rua do Dr. Pitta, a residência foi substancialmente ampliada e, na década de 50 do séc. XX, foi remodelada para clube privado, embora a constituição do British Country Club ou Clube Inglês só date da década seguinte. Nas décadas de 60 e 70 foi sendo ainda total e completamente remodelada, dotada de um importante complexo de piscinas, tal como de um parque que descia ao longo da escarpa, para o Ribeiro Seco. Nesses anos foi palco de inúmeros eventos desportivos e tornou-se num dos mais emblemáticos espaços de lazer do Funchal. As reformulações políticas da sociedade madeirense ao longo da segunda metade da década de 70 levaram à sua expropriação pelo Governo Regional, passando à tutela do mesmo em 1980. O edifício principal chegou a albergar exposições temporárias, como em 1991-1992, a dedicada a Cristóvão Colombo e a Madeira, sendo, pouco depois, sede da Proteção Civil regional e Biblioteca de Culturas Estrangeiras na Madeira, enquanto o parque, entre muitos outros eventos, foi palco do Open Madeira em ténis e de várias edições do Funchal Jazz Festival. A partir de 2006, a construção de outras infraestruturas desportivas e as dificuldades de acesso do espaço para automóveis em eventos alargados levou a um progressivo abandono da Quinta Magnólia. A partir de 2008, especialmente, todo o espaço entrou num rápido processo de degradação, até por alguma indefinição da sua tutela direta. Entretanto, a Quinta Magnólia foi entregue à Sociedade Metropolitana de Desenvolvimento para ser objeto de estudo de requalificação, tendo um primeiro projeto sido elaborado em julho de 2007, pelo gabinete CMARQ, Projectos de Arquitetura Ldt. Em meados de 2013 ainda a Sociedade Metropolitana anunciava à população madeirense que a quinta fora cedida em maio desse ano por um período de sete anos, indo sofrer obras de reabilitação para colmatar a degradação do espaço, calculando-se então um investimento até um milhão de euros. No entanto, salvo melhor opinião, é todo um modelo estatal de desenvolvimento que tem os dias contados, tendo acabado o ano de 2016 e nada se tendo feito de concreto. Rui Carita Professor da UMa

A Linguística

Linguística é uma ciência insuficientemente conhecida. Comparando com outras áreas do saber, poucas são as pessoas que a identificam. A linguagem, manifestada nas línguas, é a matéria que estuda. Há quem não saiba o que é a Linguística. Algumas pessoas restringem-na à Gramática para definir o que está certo (segundo a norma) ou errado (contrário à norma). Há quem pense que não tem relação com a Comunicação, ao encará-la como uma área distinta. Certas pessoas reduzem-na à inutilidade, por apenas estudar a linguagem. A falta de conhecimento poderá advir do ensino básico e secundário, explicando o desconhecimento do cidadão comum e, estranhamente, de estudantes universitários. No conjunto das ciências, a Linguística é um caso singular. Partilhando das características das ciências humanas, já que a linguagem verbal é um produto do ser humano, não deixa de ser uma ciência social (um dos pilares fundamentais da sociedade é a linguagem, sobretudo a verbal). No entanto, também possui uma cientificidade que a leva para outra dimensão. Por exemplo, a Fonética, na vertente Articulatória, compartilha de conhecimentos da Anatomia e, no ramo da Acústica, liga-se à Física. A Linguística está na base de várias disciplinas, incluindo a Terapia da Fala, e é essencial a muitos domínios do saber, como a Antropologia ou o Direito. Porém, acaba por ser pouco valorizada, o que é inexplicável. Procurar razões para este facto implicará concluir que são múltiplas. Uma delas radicará na reduzida importância que uma comunidade confere à sua língua. Os fracos conhecimentos linguísticos manifestam-se diariamente. Faltam palavras aos jovens (e aos adultos), que não conseguem articular um discurso para explicar o que desejam ou o que pensam. Usam termos com sentidos que não têm e confundem-nos com outros. Estes são problemas interessantes para a Linguística e de que os falantes não se dão contam. Vocábulos como “espartilhar” e “estofar” podem ilustrar o fenómeno? 1. Que termo é sinónimo de “espartilhar”? a) fragmentar b) ajustar c) vestir Solução: Dos três verbos apresentados, “ajustar” será o sinónimo de “espartilhar”. Explicação: Incompreensivelmente, usa-se “espartilhar” com o sentido de “fragmentar”, mas significa “apertar com espartilho”, ou seja, “ajustar algo”. Formou-se com “espartilho” e “-ar”. O espartilho é uma peça de vestuário feminino que funciona como uma cinta. Já passou de moda, mas ainda é usado para apertar o corpo da mulher, ajustando-o a medidas estereotipadas. 2. Que termo é sinónimo de “estofar”? a) cultivar b) acolchoar c) refogar Solução: O verbo “acolchoar” é o sinónimo de “estofar”. Explicação: Embora aconteça, não se deve confundir “estufar” e “estofar”. Enquanto “estufar” aponta para “aquecer”, relacionando-se com “estufa”, “estofar” interliga-se com “estofo”, isto é, “um enchimento”. Coloca-se um problema de homofonia, sendo a Semântica imprescindível para o resolver. Helena Rebelo Professora da UMa