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25 anos da Universidade da Madeira

Escrever sobre os 25 anos da UMa é para mim um exercício complicado. Foram quase 18 anos desde que ingressei por concurso na UMa como assistente estagiário em 1995 para o então Dep. de Matemática. Tinha terminado a minha formação de Engenharia Informática no Técnico e era bolseiro do INESC. Queria regressar à Madeira e existiam poucas oportunidades realmente interessantes pelo que a improvável ideia de ingressar numa carreira académica acabou por ser a mais interessante. É um exercício complicado porque para mim é difícil dissociar estes anos de um percurso pessoal que só consigo testemunhar na primeira pessoa.

Desde essa altura em que partilhei com os Profs. José Carmo e Rita Vasconcelos um pequeno gabinete em instalações absolutamente precárias no Edifício do Castanheiro muito aconteceu na UMa. Assisti e colaborei ativamente no desenvolvimento da área de engenharia da UMa. Primeiro ajudando a promover aquele que foi provavelmente a única fusão de departamentos feita a pensar no futuro e não nos interesses particulares. A criação do então Departamento de Matemática e Engenharias foi um marco importante na breve história da UMa e permitiu o desenvolvimento da área de engenharia que representava pouco mais de 4% dos alunos e agora representa cerca de 30%. Foi uma mudança importante que permitiu transformar a UMa de uma escola de formação de professores num escola de engenharia com um potencial muito maior em termos de impacto e futuro para a região.

Não foi um caminho fácil, lembro-me perfeitamente que muitos consideravam que não seria possível à UMa ambicionar a ter uma formação de engenharia que parecia apenas ao alcance das grandes escolas do continente. O processo começou timidamente com a criação de uma licenciatura em Ensino de Informática (ainda na tradição da formação de professores) e foram precisas muitas reuniões e discussões para conseguirmos criar o curso de Engenharia Informática. Fui diretor deste curso desde o seu lançamento até a acreditação pela Ordem dos Engenheiros. Nessa altura recrutamos vários professores estrangeiros que deram continuidade a uma tradição que continuou de forma intensa até aos dias de hoje. Uma tradição de abertura ao exterior e de combate a um problema grave de reputação que regiões como a Madeira enfrentam. Ainda hoje é mais fácil recrutar alunos e professores no estrangeiro do que no continente.

Pelo caminho tive ainda uma passagem pela Reitoria como vice-reitor onde liderei o projeto de Bolonha da UMa. Foram tempos atribulados mas igualmente estimulantes. Recordo com particular satisfação uma workshop organizada no auditório do Castanheiro com a presença de várias personalidades de alto nível que se disponibilizaram para dar o seu testemunho sobre o projeto de Bolonha da UMa. Foi uma altura de enorme estímulo intelectual onde destaco as longas discussões com os Profs. Castanheira da Costa e João Vasconcelos e Costa que foram coautores de um projeto de educação liberal absolutamente pioneiro no nosso país. Foi um projeto ambicioso que nos colocou no mapa do ensino superior em Portugal mas que criou uma tempestade perfeita. Colocou em confronto as limitações da UMa – desde as guerras de protagonismo ao provincianismo de quem se sente mais confortável a copiar modelos conservadores do que a arriscar ter um projeto educativo próprio, inovador e arrojado.

Na altura escrevi na revista da AAUMa que levar a bom porto um projecto desta natureza implicava um conjunto de condições que infelizmente são difíceis de reunir: estabilidade para pensar o futuro sem receios; liderança motivadora que respeita as divergências mas tem coragem para tomar decisões; investimento porque não é possível fazer bons projetos sem recursos; e finalmente credibilidade que resulta em entusiasmo, contagia e mobiliza as pessoas. O projeto de Bolonha da UMa foi uma enorme lição de vida bem como o testemunho das limitações culturais e institucionais da nossa academia. A sua incompreensão gerou uma sucessão de erros de implementação com elevados custos institucionais que ainda hoje pagamos muito caro. Os atuais estatutos da UMa, de cuja assembleia estatutária fiz parte, são outro exemplo de uma reforma ambiciosa mal aplicada com elevados custos institucionais. Em ambos os casos o diabo estava, como sempre, nos detalhes.

Mas foram estes mesmos ingredientes que conseguimos reunir passado pouco tempo quando o governo lançou as parcerias internacionais com as Universidades americanas. Foi mais uma janela de oportunidade que conseguimos aproveitar lançando as bases do que é hoje o Madeira-ITI. A estabilidade foi conseguida pela associação às instâncias regionais e aos centros de investigação muito menos susceptíveis às guerras e invejas académicas fratricidas. A liderança partilhada pelo MCTES, FCT e direções dos programas onde estavam alguns dos melhores académicos portugueses e americanos. Os recursos públicos e privados colocados à disposição mas sujeitos a um escrutínio e avaliações constantes e implacáveis. A credibilidade de uma Universidade realmente de topo como a Carnegie Mellon. Estes ingredientes permitiram recrutar e atrair investigadores e alunos de topo para o Madeira-ITI e com isso contornar o enorme problema de reputação que uma instituição como a UMa enfrenta.

Passados três anos o Madeira-ITI é hoje em dia uma referência na investigação e formação avançada em tecnologias interativas – uma área particularmente competitiva. Inauguramos recentemente novas instalações que revelam a ambição de um projeto que muitos julgavam impossível numa região como a Madeira. Demonstramos que é possível à UMa estabelecer parcerias frutíferas com as entidades regionais sem abdicar da sua autonomia. Eu próprio há 18 anos atrás quando comecei a minha carreira na UMa nunca pensei que podíamos chegar tão longe em tão pouco tempo. Do nada para uma instituição que forma profissionais para a Apple, Google e eBay. Que lidera as publicações nas conferencias de referência ao lado das melhores instituições europeias e muito à frente de qualquer outra Universidade portuguesa. O projeto do Madeira-ITI demonstra que a UMa pode e deve ter ideias próprias que se tornem uma referência. Demonstra que ser jovem e estar numa região ultraperiférica longe dos centros de decisão não é uma justificação para não fazer mais e melhor. Demonstra que os nossos jovens e as nossas empresas têm todo o direito a uma educação de qualidade e parcerias de alto nível. Talvez por tudo isto seja um projeto tão pouco acarinhado internamente porque desafia os limites de quem por incompetência se acomoda com a mediocridade. Por isso a minha relação com a UMa sempre foi muito estranha. Como dizia Groucho Marx “nunca faria parte de um clube que me aceitasse como membro”.

Nuno Nunes
Diretor do Madeira-ITI

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