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Grécia

Coletânea de textos antigos de Ginecologia

As Edições Húmus apresentaram uma coletânea que reúne os textos mais importantes da tradição médica sobre doenças das mulheres. A publicação contou com a organização de Cristina Santos Pinheiro e Joaquim Pinheiro.

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A diversidade na obra de Íon de Quios

Memorandum A diversidade (polyeideia) na obra de Íon de Quios Com os fragmenta de Íon de Quios enriquecemos as nossas perspectivas de análise do séc. V a.C., por vezes excessivamente concentradas em Atenas. Entre poesia e prosa, somos seduzidos por um corpus com diversos saberes Como realça a Suda – monumental enciclopédia do séc. X –, uma das marcas da produção literária de Íon de Quios (c. 490-480 a.C.) é a diversidade. Embora não nos tenha chegado nenhuma obra na íntegra, desde meados do séc. XX que vários estudos se têm dedicado à análise dos fragmenta e testimonia, revelando, assim, uma obra muito interessante de um autor, aparentemente, periférico. Além da composição de tragédias, ditirambos, poesia lírica, sabemos que escreveu uma obra sobre a fundação e a história mítica de Quios, que para alguns terá sido uma obra relevante no percurso da historiografia antiga, uma outra sobre cosmologias e também registou memórias (hypomnemata). Há um conjunto de fragmentos, em prosa, que parecem integrar um conjunto de textos sobre embaixadas (presbeutikos) ou ‘visitas’ (epidemiai). No entanto, há muitas dúvidas sobre a organização deste conjunto de fragmentos, não sendo fácil perceber se integrariam ou não a mesma obra. No caso das Epidemiai, M. West (1985), “Ion of Chios”, BICS 32: 75, classifica-a como uma obra pioneira, escrita em forma de diálogo, que demonstra o acesso e a convivência de Íon com conhecidos políticos, figuras militares, escritores e importantes famílias. Devido ao seu teor, esta obra teria um assinalável valor biográfico, podendo ter exercido em autores da época, como Xenofonte (Memorabilia), até por ser citado por Plutarco, o mais conhecido biógrafo da Antiguidade. O facto de Plutarco, um autor dos séculos I e II d.C., fazer referência a Íon, pode ser lido como uma prova da importância das suas narrativas e da influência da técnica biográfica das Epidemiai, nomeadamente ao nível do retrato fisiognomónico. É curioso que Plutarco, num dos passos em que aborda o tema da ‘fortuna’ (tyche) na acção humana (Sobre a fortuna dos Romanos 316d), faça referência a uma sentença do poeta Íon: a ‘fortuna’ e a ‘sabedoria’ (sophia) são coisas diferentes, mas ambas podem fortalecer cidades, embelezar homens, trazendo ‘glória’ (doxa), ‘poder’ (dynamis) e ‘hegemonia’ (hegemonia). Acredita-se que seja uma alusão às Epidemiai de Íon. Contudo, como muitas vezes sucede a quem se dedica ao estudo da Antiguidade Clássica, a ausência de fontes escritas só nos permite colocar hipóteses e algumas conclusões parciais. Se considerarmos a pervivência das referências e as alusões à produção literária de Íon, sobretudo à sua poesia, não deixa de ser curioso verificar a considerável projecção de um autor de uma pequena ilha do Egeu, conhecida pela qualidade do vinho ou dos figos, mas também pelo sistema democrático, eventualmente anterior ao que Clístenes instituiu em Atenas. De facto, o percurso de Íon de Quios, com ligações a Sófocles, Címon, Ésquilo, Péricles, Sófocles ou Temístocles, das figuras mais relevantes do séc. V a.C., revela uma mundividência alargada e que garantiu à sua obra uma difusão por vários séculos. Entre marcas identitárias da sua ilha e da polis central, Atenas, Íon constrói, por vezes, uma observação do mundo consentânea com a de um cosmopolita. De igual forma, entre prosa e poesia, evidencia um espírito de polímata, ao estilo do pensamento jónico, com capacidade criativa e atento às circunstâncias políticas e sociais do seu tempo. É disso exemplo o uso que faz do corpus mitológico, nas tragédias, por reconhecer o seu poder de influenciar concepções políticas, sociais ou mesmo a identidade cultural. Esquecido durante muitos séculos, o corpus literário de Íon de Quios poderá, com novas estudos e linhas de interpretação, contribuir para um melhor conhecimento da realidade helénica, sobretudo de espaços mais periféricos, mas, sem dúvida, muito relevantes pela diversidade conceptual, capaz de abrir novos caminhos hermenêuticos a trilhar. Joaquim Pinheiro Docente da UMa Escrito de acordo com a antiga grafia.

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“Gynaikeia”, coisas de mulheres…

Gynaikeia é uma palavra grega que, como substantivo plural, constitui o título de alguns tratados médicos antigos dedicados às doenças femininas. Significa, à letra, “o que diz respeito às mulheres” e pode designar os órgãos sexuais femininos, as doenças específicas das mulheres ou os remédios para essas doenças, ou a menstruação. Na história da medicina, estes tratados foram pouco estudados, quer por se considerar que abordavam um tema com pouco interesse, que normalmente se relegava para o âmbito feminino, quer porque as matérias que exploravam eram consideradas pouco dignas de atenção. A saúde reprodutiva das mulheres foi, no entanto, temática presente na medicina ocidental desde os seus primórdios. Do conjunto de textos médicos atribuídos a Hipócrates, fazem parte três livros a que se atribui o título de Peri gynaikeion, Sobre as doenças das mulheres, e que devem ter sido formados por um processo de compilação provavelmente terminado em finais do século V ou início do século IV a. C. Alguns séculos mais tarde, Sorano, médico grego que praticou medicina em Roma no século I-II d. C., compôs um tratado de ginecologia com o mesmo título. Este tratado foi traduzido e adaptado por vários autores posteriores e o seu conhecimento manteve-se durante séculos na Europa, especialmente graças à versão de um autor desconhecido, de nome Mústio ou Múscio, que, preservada em múltiplos manuscritos, é integrada nos compêndios de ginecologia impressos no Renascimento. No início do século XVI, a redescoberta dos textos hipocráticos sobre ginecologia está na base de um novo interesse por esta área da medicina. O facto de o “pai da medicina” poder ser também considerado “o pai da medicina das mulheres” legitima que o médico de instrução universitária se dedique ao que até então tinha sido maioritariamente um campo de intervenção feminina, dominado por parteiras sem preparação teórica. Nomes como o dos italianos Ludovico Bonaccioli e Girolamo Mercuriale (mais conhecido pelo seu tratado De re gymnastica), o espanhol Luis de Mercado, os franceses Nicholas de la Roche e François Rousset (autor do primeiro tratado médico sobre cesariana) ou o nosso tão pouco reconhecido Rodrigo de Castro Lusitano tornaram-se referências na génese da ginecologia como uma especialidade médica, dando continuidade à concepção hipocrática de que as mulheres carecem de um tratamento médico diferenciado. Como se lê no tratado hipocrático (1.62), as doenças das mulheres são difíceis de perceber porque “as mulheres têm doenças próprias e por vezes nem elas próprias sabem o que lhes está a acontecer até experimentarem as doenças que são causadas pela menstruação e irem envelhecendo.” Mas o papel dos médicos é igualmente importante, já que, “por não se informarem com exactidão do motivo de uma doença concreta” a tratam “como uma doença de homens”. Com base nesta diferenciação entre dois corpos que têm naturezas e condições diferentes, construiu-se um conjunto de textos médicos que caiu no esquecimento e que, na prateleira dos reservados de uma biblioteca ou num documento pdf do Google books, aguardam a devida atenção. Cristina Santos Pinheiro Universidade da Madeira/Centro de Estudos Clássicos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

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Mitos clássicos, hermafroditas e andróginos: um desafio?

De acordo com a versão de Ovídio, Hermafrodito era filho, como o nome indica, dos deuses Hermes e Afrodite. Poucas categorias se terão mostrado, ao longo dos séculos, tão estranhamente e ao mesmo tempo estáveis como as de sexo e género. Ainda que a dicotomia homem/mulher, macho/fêmea seja considerada “natural”, por se basear em características biológicas, não deixou de com frequência se mostrar insuficiente. Alguns mitos clássicos problematizam esta diferenciação, apresentando uma reflexão acerca da forma como os traços biológicos associados à noção de sexo condicionam as expectativas culturais que configuram o conceito de género. Por esta razão, seres que reúnem elementos dos dois sexos afloram aqui e ali na mitologia, desafiando o que os Gregos consideravam ou “feminino” ou “masculino”. Seres hermafroditas como o próprio Hermafrodito ou como o andrógino do Banquete de Platão revelam os sinais de uma análise mais ou menos coerente da necessidade social do outro, do anseio pela “cara-metade” enquanto base fundamental da existência humana. De acordo com a versão de Ovídio, Hermafrodito era filho, como o nome indica, dos deuses Hermes e Afrodite. Era um jovem belo e garboso, que, nas suas viagens pelo mundo, encontrou um lago de águas cristalinas onde habitava uma ninfa, Sálmacis. Tomada de amores pelo jovem, a ninfa declara-se mas não obtém dele mais do que repugnância e desprezo. Afasta-se então, mas enquanto Hermafrodito, seduzido pela frescura do lago, se banha nas suas águas, Sálmacis atira-se ao jovem, abraça-o e pede aos deuses que nunca os separem. Por algum motivo insondável, os deuses anuíram e fizeram de dois corpos um só. E, acrescenta Ovídio, não se percebe se é homem ou mulher, porque não parece nem um nem o outro, mas ambos. Aristófanes, uma das personagens d’O Banquete de Platão explica a orientação sexual de cada indivíduo com o mito do andrógino. Num passado remoto, existiriam à face da terra três tipos de seres, cada um constituído por duas metades: um ser que tinha duas metades masculinas, outro tinha duas femininas e o terceiro tinha uma metade de cada género. Como, por se sentirem completos, se tornaram demasiado confiantes, decidiram atacar os deuses que, em resposta, os dividiram a todos ao meio. Assim nasceu a actual raça humana: cada um sente a falta da sua metade. Ora, se um indivíduo resulta da separação do ser andrógino, que tinha uma metade masculina (andro-) e uma feminina (gino-), procurará um parceiro do sexo oposto. Todavia, se resulta da separação dos outros dois, procurará um parceiro do mesmo sexo. Estes são apenas dois exemplos duma preocupação constante na história da humanidade: a de criar categorias para explicar, para “arrumar” o mundo. A possibilidade de existir “o verdadeiro hermafrodita”, um ser com os dois sexos capaz de gerar em si próprio, foi durante muito tempo uma ideia assustadora. Ao longo dos séculos, o hermafroditismo e a homossexualidade foram identificadas como patologias, por vezes temidas e associadas às maquinações de forças diabólicas; outras vezes foram consideradas prova do poder exuberante da natureza que não se rege pelas normas dos homens. E neste momento da história onde nos situamos? Cristina Santos Pinheiro Docente da UMa

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Gonçalo M. Tavares e os clássicos em os velhos também querem viver

Em Sarajevo ou numa polis grega, o mito de Alceste é sempre desconcertante. A reflexão sobre a morte, em forma de sacrífico estóico, torna-se também uma meditação sobre o valor da vida. Na verdade, revisitar um mito clássico é mergulhar na nossa memória colectiva. O legado da Antiguidade Clássica tem-se exprimido, ao longo de muitos séculos, por meio de várias realizações humanas. Constituindo-se como elemento identitário, a mitologia é, sem dúvida, um dos melhores exemplos dessa pervivência. Continuamos a ouvir expressões como “bonito como Adónis”, “veloz como Aquiles”, “forte como Héracles”, “esperto como Ulisses”, “bela como Helena”, “canta como as Musas e toca como Orfeu”… Podemos, ainda, conduzir um “Clio”, aproveitar o programa passageiro frequente “Ícaro”, nadar no centro “Neptuno”, passear o cão “Argos”, comprar uma peça “Pandora”, beber uma água da marca “Fonte de Castália” no café “Apolo”, para de seguida ir ao estúdio de arquitectura “Dédalo”. Não faltam, de facto, exemplos. O nosso propósito, neste breve texto, porém, é o de nos concentrarmos no exercício intertextual de um autor da nossa literatura: Gonçalo M. Tavares (GMT). Uma das marcas temáticas da escrita de GMT, talvez o autor da nova geração de escritores da literatura portuguesa mais lido e premiado, é a do diálogo com a cultura clássica, sobretudo nas obras Histórias falsas, Uma viagem à Índia e, mais recentemente, Os velhos também querem viver. É precisamente sobre esta última que vos escrevemos. Inspirando-se na tragédia Alceste de Eurípides, GMT propõe-nos em forma de peça teatral – já levada à cena pela Companhia Cão Danado, com encenação de Cristina Carvalhal – a conhecida e dramática história da mulher (Alceste) que dá a vida pelo marido (Admeto). Sim, trata-se de uma história de amor que nos catapulta para, nas palavras de Frederico Lourenço, o “trágico no superlativo”, como sucede, por exemplo, na história de Hécuba, a mãe que assiste à morte da filha (Políxena) sem nada poder fazer e que encontra a boiar na praia o cadáver do filho mais novo, Polidoro, mas que depois se vinga, obviamente, no superlativo: não só arranca, com as suas próprias mãos, os olhos a quem lhe matara Polidoro, como, se isso não bastasse, ainda lhe mata os filhos. Muito chocante ou horrendo? Então é melhor nem falarmos das mães filicidas, Medeia e Procne! O trágico grego é, de facto, muitas vezes essa torrente irresistível que deixa o leitor/espectador desconcertado com a dimensão (des)humana. Apesar de usar a estrutura Prólogo>sequência de 4 cenas>Epílogo, integrando também a participação tão clássica do Coro, a verdade é que o texto literário de GMT não atinge a dimensão lírica do drama trágico grego, sobretudo ao nível do ritmo métrico. Deixando de parte estes e outros pormenores técnicos, directamente relacionados com o género literário, interessa-nos aqui, sobretudo, abordar a temática da obra. O título, Os velhos também querem viver, pode levar o leitor a pensar que se trata de uma reflexão gerontológica, numa altura em que tanto se fala e escreve sobre o envelhecimento da população europeia. Nada disso. GMT recupera um dos paradigmas do amor conjugal da mitologia clássica, a relação de Admeto e Alceste, para reflectir sobre temas universais, como o amor (conjugal, paternal, filial), a vida, a morte, a guerra ou o sacrifício. A história não decorre numa polis grega, mas em Sarajevo, umas das cidades mais massacradas pela Guerra dos Balcãs. Como milhares de homens, Admeto é atingido por um sniper. Prestes a morrer, Apolo permite-lhe viver, se em troca alguém morrer por ele (“A Morte tem de levar alguém, já se sabe”, p. 19). Em aflição, pergunta se alguém em Sarajevo quer morrer por ele, “mas ninguém aceitou, nem amigos, nem pai, nem mãe.” (p. 16). Só Alceste se sacrifica pelo marido. Esta aceitação gera uma dialéctica entre a morte moderna e a antiga, notando-se, parece-nos, na reflexão de GMT algumas marcas do pensamento filosófico de Séneca. Antes de transitar para lá da vida, a serva conta que Alceste pediu aos deuses que cuidassem das suas duas crianças e que fosse dado um casamento e glória para o filho e um casamento e honra para a filha. Além disso, suplicou que não morressem cedo e que não fossem felizes antes do tempo, se possível na terra pátria. GMT aproveita este momento, de nítida tensão dramática, para interromper a narração e, como num estásimo (uma das partes da tragédia grega), falar da realidade tão presente, nos nossos tempos, dos filhos que têm de sair de casa e do seu país. Mas Alceste tem também palavras para Admeto, seu marido: recorda-lhe que nem o pai, nem a mãe, aceitaram morrer por ele, mesmo sendo filho único (“Mesmo velhos, preferiram viver”, p. 29). Com essa opção, impediram, segundo Alceste, que os filhos crescessem com a mãe. Em troca do seu sacrifício, exige que Admeto jure nunca mais dar uma segunda mãe aos filhos. E, num ápice, morre. Este é, de facto, o momento, o clímax desta obra, bastante antecipado em relação ao que costuma ser normal no género. Não cabe neste espaço explorar outros elementos interessantes que ocorrem até ao final da obra: Admeto irado com o pai, Feres, por não ter dado a vida por ele; Feres a justificar ao filho que um velho também tem direito a viver e que já lhe tinha dado a vida, coisa que o filho jamais lhe poderia restituir; a intervenção de Hércules (grafia usada por GMT, embora, neste contexto helénico, ‘Héracles’ fosse mais correcto), qual deus ex machina, que resgata Alceste dos infernos para a fazer regressar à vida. O mito de Alceste, como se percebe, torna-se perturbante a vários níveis. Sendo Admeto um mortal, como permitiu, para adiar a morte certa, o sacrifício da sua mulher e, assim, deixar duas crianças sem a mãe? Como tem coragem Alceste para abandonar os filhos em prol do marido? É a vida de um jovem mais valiosa do que a de um velho? São estas e outras as encruzilhadas dos mitos clássicos. Imitados, renovados ou transformados nas várias áreas do

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